19.8.14

Capítulo Quatorze






– ACHO QUE a tensão sexual é quase um personagem nos livros da srta. Duffy – insistiu Demi, se inclinando para a frente para reforçar seu argumento. – Não apenas movimenta a trama, como mantém o leitor e os personagens no limite.
Quatro semanas no “Cantinho da crítica” tinham lhe rendido confiança o suficiente para ignorar a luz vermelha da câmera e se deixar envolver no debate. Ela ainda odiava aquilo, mas pelo menos agora conseguia ignorar. Era quase como estar de volta à sala de aula. Exceto, é claro, pela saia curta, a atenção masculina e o fato de que todo mundo ali parecia supor que ela oferecia algo mais do que seu cérebro.
– Não acha que é frustrante ter essa tensão rondando tão intensamente? Não apenas para os personagens, mas para os pobres leitores que querem que eles simplesmente mandem ver logo? – perguntou Sean, com uma carranca em desacordo com o tema. Demi comprimiu os lábios para conter um sorriso, pois sabia que ele estava tentando segurar uma risada.
– Acho que ambos concordamos que, em geral, segurar a culminação do sexo faz o leitor continuar a virar as páginas. É claro, como você diz, precisa ser feito do jeito certo, para que os leitores não fiquem frustrados a ponto de perder o interesse – explicou ela. Então, segurando o livro de capa dura virado para que a câmera pudesse captá-lo, ela prosseguiu: – Na minha opinião, a srta. Duffy faz um trabalho maravilhoso. Eu adoraria saber qual é a opinião dos leitores, no entanto. Visitem o site e compartilhem sua opinião na discussão do livro de hoje.
A luz da câmera se apagou, informando a Demi que o bloco tinha acabado. Afundando na poltrona, ela deixou o livro cair no colo e abandonou o sorriso falso que sustentava.
– Você está melhorando – comentou o louro de visual sóbrio, enquanto retirava o microfone da lapela. – Preciso admitir, eu não tinha muita certeza de como você lidaria com os meandros de um quadro regular. Principalmente porque ficava muito nervosa no ar. Mas você conseguiu mantê-lo interessante e segurar a atenção dos espectadores. Mais algumas semanas e você vai detonar todo mundo.
Demi o encarou. Ela? Detonando todo mundo? Estava mais para ser detonada. Embora não ficasse mais enjoada antes de cada programa, ela sabia que não estava no controle. Não do jeito que ficava na sala de aula.
– A propósito, o produtor quer aumentar o espaço do “Cantinho da crítica” para duas vezes por semana, a partir de segunda-feira. Ele imagina que, com a aposta de Joseph Jonas atraindo tanta atenção, mais o salto na audiência quando seu quadro está no ar, nossos índices vão subir ainda mais.
Duas vezes por semana? Demi engoliu em seco. Porém, as palavras salto na audiência ficaram ressoando em sua cabeça; então, em vez de protestar, ela assentiu em concordância.
Será que os níveis de audiência eram uma tradução do carisma ou do que quer que fosse que o professor Belkin desejava em sua assistente? Aquilo significava que ela estava progredindo. Demi sorriu tão intensamente que até doeu, agradeceu a Sean e, depois de retirar o próprio microfone, foi bater papo com a equipe no camarim.
Quando chegou lá, Demi olhou para seu reflexo no espelho. Então aquilo era detonar, hein? Aparentemente, a imagem concordava com ela, já que, se falava por si só, nunca estivera melhor.
O que a fez gargalhar. Demi, que nunca se importara com aparência, estava avaliando seu visual. É claro, o crédito por seu sorriso, radiância e estranho hábito de irromper em risadinhas era de Joe. Ou, pelo menos, do sexo incrível que eles tinham feito.
Uma onda de empolgação a atingiu quando o telefone tocou. Uma olhada breve no visor reprimiu as vibrações de esperança em seu estômago, mas não arruinou seu bom humor.
– Miley, oi – disse ela, enquanto tirava a saia. Por mais que estivesse começando a gostar de seu visual profissional extravagante, ela se sentia muito mais confortável usando o visual casual que ela e Miley tinham criado, combinando o seu estilo antigo, ou o que quer que houvesse de estiloso ali, com seu novo estilo sexy. Jeans ajustados, sapatilhas bonitinhas e blusas justas que se aproveitavam do novo acessório favorito de Demi: os sutiãs que valorizavam os seios.
– Ei, como foi a gravação?
Elas conversaram enquanto Demi trocava de roupa, e então tirava sua maquiagem de TV e a refazia com a mão surpreendentemente hábil. Ela estava ficando boa naquele negócio, percebeu.
– Então... Vejo você na sexta à noite? – perguntou Miley.
– O que vai ter na sexta à noite?
O silêncio da amiga a fez franzir a testa. Ela havia se esquecido de alguma coisa?
– Sarau da faculdade. Você não esqueceu, esqueceu? – perguntou Miley, de maneira hesitante. A voz dela estava abafada, um sinal de que havia começado a roer as unhas. – Essa é a motivação por trás da transformação, lembra-se? Mostrar ao reitor e ao professor Belkin que você é perfeita para o cargo de assistente, e não aquela garota.
Demi se jogou na cadeira. Droga. Estava tão envolvida no programa de TV e em seus joguinhos com Joe que quase tinha se esquecido de que tudo aquilo tinha sido por causa da promoção no trabalho.
Havia se passado uma semana e meia desde que ela lhe servira panquecas e determinara algumas condições para os encontros entre eles.
Joe havia tido um problema profissional em Nova York e o encontro deles fora adiado para essa sexta-feira agora.
Como uma criança emburrada, ela fez um beicinho e suspirou. Sentia como se tivesse acabado de ouvir que não podia brincar com seu brinquedo favorito. Ou, usando os termos de uma mulher adulta, com seu bonequinho favorito.
Demi estremeceu diante daquele pensamento, pois aquela ideia, mais o estado constante de consciência sexual no qual ela se encontrava desde aquela noite com Joe, respaldavam a teoria idiota dele sobre luxúria.
– Você vai comparecer? – As palavras de Miley saíram tão truncadas que Demi imaginou que ela provavelmente estivesse roendo pelo menos duas unhas a essa altura.
– É claro. – Afinal, o sarau da faculdade era o que importava. Seu cargo de professor, sua carreira, sua promoção. Aquilo representava a verdadeira Demi, aquilo seria perene. Todo o restante, ainda que fosse maravilhoso, duraria apenas um verão. Ao fim do semestre, ela voltaria ao seu mundo real. Embora, definitivamente, atraindo mais atenção. – Como você disse, essa foi a motivação por trás de tudo.
E era, ela assegurou a si alguns minutos depois, quando desligou. A transformação, a vaga na TV, até mesmo as apostas com Joe, era tudo por um motivo. Para lhe dar a ousadia necessária para refutar a avaliação do professor Belkin, e, mais importante, a de seu pai, em relação à habilidade dela de comandar uma turma lotada de um modo capaz de aumentar os rendimentos e o prestígio do Departamento de Literatura.
Isso – ela olhou em volta do camarim minúsculo – era apenas temporário. Precisava se lembrar disso. Demi olhou para o livro em cima de sua bolsa, uma das obras escolhidas por Joe para serem resenhadas. As apostas, o relacionamento entre eles – se sexo ótimo e de outro mundo baseado em uma aposta pudesse ser chamado de relacionamento –, tudo era temporário. Apenas degraus para ela alcançar seu verdadeiro objetivo.
Ela pensou em Joe, no jeito como ele sorria enquanto acariciava o corpo dela até o auge das chamas, o jeito como os olhos dele ficaram nebulosos quando ele chegou ao clímax. O lugar dele na vida dela era tão real quanto seu decote. Ela precisava manter isso em mente.
Se o fizesse, talvez fosse ficar mais fácil quebrar seu vínculo com ele.
Joe olhava para a tela de seu laptop, tentado fechá-la raivosamente. Mas quebrar o computador não iria ajudar. Não durante sua crise hedionda de bloqueio criativo, ou de sua frustração sexual, que provavelmente era a causa do bloqueio criativo.
Ele olhou ao redor, pelo quarto do hotel, tentando encontrar uma distração. Mas, além de quadros horríveis e da cama, não havia nada. Deliberadamente nada. Como sempre, ele pedira para a TV ser retirada antes de fazer o check-in e também solicitara o bloqueio da internet.
O celular tocou. Ele ficou tão grato por aquela distração que nem mesmo verificou o identificador de chamadas antes de atender.
– Joe?
Mas que droga. Era isso que ele ganhava por ceder à frustração. Sentiu a raiva e o ressentimento automáticos dando um nó apertado em seu estômago.
– Oi, mãe.
– Querido, preciso de sua ajuda.
É claro que precisava. Ela não teria telefonado se o motivo fosse outro.
– Eu vou me casar... – Ela fez uma pausa para aguardar a reação dele.
Joe permaneceu em silêncio. Não porque estivesse preocupado com a possibilidade de dizer algo muito feio. Não, simplesmente porque não havia mais nada a dizer. A mulher tinha mais casamentos no currículo do que Joe tinha livros publicados. E os casamentos dela duravam mais ou menos o mesmo tempo que Joe levava para escrever um livro.
– Jeremy é tão gentil, Joe. Ele é o homem perfeito para mim. –
Traduzindo: ele era rico. – Tem só uma coisinha. Ele é escritor. Escreveu um original maravilhoso. Bem, presumo que seja. Na verdade eu não li, claro. Quero dizer, foi como eu disse a ele, tolinho, eu não leio nem mesmo os seus.
Alheia ao insulto e, como sempre, desinteressada pela vida dele, a mãe começou a matraquear sobre seu futuro marido, seus planos e suas muitas novas aquisições.
Uma dor que ele recusava a reconhecer cortou Joe. Ele engoliu em seco e cerrou o maxilar, sabendo que era inútil censurá-la. Ele nunca era procurado pela mãe, a menos que ela quisesse alguma coisa. Quando era criança, ele era usado para bancar o órfão de pai desamparado para que sua dramática mãe solteira desse o golpe para agarrar um novo marido. Agora, eram o dinheiro e os favores. Como ela o manipulava com a mesma facilidade com que o fazia com os homens que perseguia, Joe sabia que lhe daria o que quer que ela desejasse. O que só o irritava ainda mais. Prova de que as emoções só existiam para favorecer as mulheres. Os homens sempre se davam mal.
Joe espiou seu laptop e cerrou os dentes. Aquele era o preço pela procrastinação. O bloqueio criativo sobre o qual estivera se lamentando se dissipou de repente. Como sempre, dois minutos de conversa com a mãe e ele começava a desejar desesperadamente se perder na segurança e sanidade de seu mundo literário.
– Joe – disse a mãe, ao fim do monólogo. – Preciso de um favorzinho.
Finalmente, o objetivo. Ele esperava muito que fosse um favor que requeresse sua assinatura em um cheque, e acabasse logo com aquilo.
– Quero que você arrume um contrato de publicação para Jeremy. Talvez um igual a esses que você tem. Você sabe, com um adiantamento bem grande. Para fazermos aparições públicas, televisão, eventos midiáticos. Vai ser tão divertido. Um escritor e sua esposa em turnê. Não parece perfeito? Ganharei… Ganharemos uma fortuna.
– Não sou agente ou editor, Lori. – O termo mãe só era usado quando ele estava desempenhando algum papel. Do contrário, ele preferia seu nome de batismo. – Eu sei disso, Joseph. Eu só queria uma ajuda. Parte meu coração saber que Jeremy não vai realizar seu sonho. Eu nunca realizei o meu, você sabe. Tive de abrir mão do meu maior desejo, que era ser dançarina, por, você sabe, por sua causa. – Seu suspiro foi trágico.
Muito mais por causa de um preservativo furado, mas que se danasse. Os dedos de Joe coçavam para pegar o talão de cheques. Por que ela não podia simplesmente querer dinheiro? Assim teria sido um favor simples, sem derramamento de sangue. Sabendo que protestar serviria apenas para incitar mais chantagem emocional, ele suspirou.
– Envie-me os originais e as informações de contato. Vou encaminhar ao meu agente.
Tendo conseguido o que desejava, a mãe dele agradeceu superficialmente, se adiantou para as despedidas e desligou.
Joe precisava escrever do mesmo jeito que um alcoólico precisava de uma bebida. Desesperadamente, loucamente, irracionalmente.
Mas, em vez disso, ele cedeu à necessidade de afastar os sentimentos negativos deixados pelo telefonema. Pegou o celular outra vez. Mesmo enquanto dizia a si estar sendo ridículo, ele discou um número da agenda.
– Alô.
– Demi – disse ele em saudação, ajeitando as almofadas detrás de si e se recostando na colcha horrorosa com estampas florais. – Como estão as coisas?
– Joe?
Ele fez uma careta por causa do choque dela. O quê? Ele não podia telefonar? Remexendo-se sobre as almofadas, ele teve de lhe dar algum crédito. Via de regra, ele não telefonava para as mulheres.
– Recebi seu e-mail sobre a mudança de nosso encontro para sexta-feira à noite. Que tal no sábado, em vez disso?
– Sábado está bom – concordou ela lentamente. Ele captou a incerteza em sua voz e disse a si que era por ela não compreender por que ele simplesmente não tinha mandado um e-mail sugerindo a nova data. Não era porque ela não queria vê-lo, não podia ser. Ele não pensava ser capaz de tolerar mais golpes sobre seu já fragilizado ego.
– Eu também queria saber como você está se saindo com suas resenhas – mentiu ele, não muito certo de por que precisava ouvir a voz dela. – Não é amanhã o dia de publicar a primeira delas no site?
A hesitação de Demi era quase palpável, como se ela soubesse que ele estava de enrolação e não tivesse certeza se queria receber ligações dele ou não. Por sorte, como ele não tinha nenhum outro pretexto, ela simplesmente respondeu com um “Aham”.
Aquele sonzinho arfante fez a libido já tensa de Joe ir às alturas. Foi o mesmo som que ela fez quando ele lambeu seu corpo.
– Terminei a resenha de O efeito Michel Angelo – informou Demi. – Na verdade, eu estava fazendo uma leitura final antes de enviar.
– Você se importaria em compartilhar?
– Leia no site de manhã.
– Tem certeza? Eu poderia lhe dar algumas dicas, talvez algumas sugestões sob a perspectiva de um escritor – provocou ele.
– Certo. Porque nossas opiniões sobre o que faz uma boa história são tão parecidas – rebateu ela.
Joe pensou no assunto por um instante.
– Você sabe, tirando sua visão romantizada de intimidade... – A qual a mãe dele provara consistentemente ser um pesadelo. – Elas provavelmente são.
– Minhas visões não são romantizadas – protestou ela.
Ele sorriu. Perfeito. Acomodou-se nas almofadas e se permitir deixar levar na conversa. Depois de 45 minutos de debate sobre o assunto, ela finalmente admitiu que ele estava certo. Eles tinham de fato ideias semelhantes sobre o que fazia uma boa história emplacar.
Joe não tinha certeza de como se sentia agora, no entanto. Empolgado e entusiasmado para escrever, definitivamente. Mas só um pouquinho preocupado. Justificar seu ponto de vista tinha sido um desafio. As opiniões dela eram bem elaboradas e solidamente amparadas por argumentações suficientemente respaldadas. Era difícil refutá-las.
O que não significava um bom sinal para a aposta deles.
– Você já resolveu seus negócios aí em Nova York? – perguntou Demi, depois que ele ficou em silêncio.
– Quase. – Joe hesitou, então, sem saber muito bem por que, admitiu: – Preciso resolver algumas coisas para minha mãe, o que, no mínimo, vai exigir um almoço doloroso e, na pior das hipóteses, alguns jantares desagradáveis.
– Lamento – disse ela, a palavra soando delicada e, bem, doce. Sem nenhum traço de julgamento ou mesmo de surpresa. – Problemas com os pais são complicados, não é mesmo?
Joe deu uma risada amarga.
– Você tem problemas com seus pais? – perguntou ele, sem desejar admitir o quão facilmente sua mãe conseguia manipulá-lo emocionalmente. Afinal, ele alegava não acreditar em emoções.
– Creio que não poderiam ser chamados de problemas, embora, definitivamente, seja algo unilateral.
– Do seu lado ou do deles?
– Do meu. Perdi minha mãe quando era pequena. Meu pai… – Ela parou de falar. O suspiro foi pesado o suficiente para fazer Joe desejar se enfiar na linha telefônica e abraçar Demi. – Na maior parte do tempo, eu duvido muito que ele esteja ciente da minha existência. Ele ficaria chocado se percebesse que tenho problemas com isso.
– Então vocês não se veem muito, suponho.
O que ele não daria para poder dizer o mesmo sobre sua mãe. Ou para não se sentir tão culpado por desejar esse tipo de coisa.
– Na verdade, normalmente nos vemos no mínimo algumas vezes por semana – contou Demi, tirando Joe de sua reflexão sombria a respeito do próprio drama familiar e de volta à conversa. – Ou, eu deveria dizer, estamos nas imediações um do outro. Meu pai não é muito conhecido por enxergar muita coisa. Para ele, sou um tanto ou quanto invisível.
Invisível? Demi? Aquele conceito confundiu a cabeça dele. Como uma mulher tão vibrante poderia não ser notada?
– Ele deve ser cego – disse Joe. Percebendo a ironia das situações de ambos, ele riu de maneira amarga. – Sabe, eu daria muita coisa para ser invisível para minha mãe. Mesmo que por alguns meses. Eu aproveitaria essa folga.
– Não consigo nem mesmo imaginar você como alguém invisível – respondeu ela baixinho. Havia um tom estranho na voz dela, aflito e triste. – Algumas pessoas têm uma qualidade indefinível que atrai atenção. Outras… nem tanto.
Joe não entendeu. Demi definitivamente atraía atenção, especialmente a dele. Devia estar falando de outra pessoa. Mas questionar aquilo o mergulharia em um campo emocional que ele estava determinado a evitar. Assim, ele se calou.
– Suas qualidades definitivamente atraem minha atenção – provocou Joe, depois que o silêncio começou a ficar desconfortável. Ele disse aquilo para aliviar a tensão, mas percebeu que não estava brincando. – Por que não falamos disso um pouco? Salve minha noite, Demi. Conte-me o que está vestindo.


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Bom, já que vocês não comentam, e a Vi e a Mari estão gostando, eu continuarei postando. Não to conseguindo postar todos os dias por causa do meu pc, como eu já tinha dito, e porque começaram minhas provas, então fica mais difícil ainda. É isso, beijos.

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