31.3.15

Capítulo Cinco




Os óculos escuros não estavam ajudando.
Cambaleando, Joe fazia o possível para manter os olhos fixos na esteira. Assim que pegasse as malas, daria o fora dali. Vovó já era crescidinha, podia chegar sozinha ao hotel. Além disso, se precisasse encarar Demi mais uma vez, ele certamente perderia a cabeça e faria alguma maluquice, como ficar olhando fixamente para os lábios dela ou tentar estrangulá-la. Era difícil saber qual das duas opções era mais provável.
— Joe? — chamou vovó. — Joe, já encontrou minhas malas?
— Não — grunhiu ele, em resposta. — E creio que seja porque eu não estou procurando por elas. Estou atrás da minha bagagem. Você mesma pode encontrar a sua e ir para o hotel maravilhoso de sempre, no centro.
Nadine segurou a mão do neto e a apertou.
— Ah, na verdade, já tenho onde ficar!
— Ótimo.
Vovó soltou sua mão e pegou o celular.
— Sim, só a limusine, por favor. Perfeito. Sim, são dois passageiros.
Ela acenou para Demi e para a outra garota. Demi ignorou Joe, o que era ótimo: ele só queria esquecer aquele dia. Ele se afastou e observou enquanto as duas garotas pegavam suas malas e saíam. Já iam tarde. Tudo o que ele queria era dormir.
Olhando pelo lado bom, ao menos vovó tinha chamado uma limusine para ele. Não que Joe fosse pobre nem algo do tipo, mas não ter mais os direitos sobre uma empresa multimilionária estava longe de ser algo positivo, ainda mais considerando o estilo de vida que ele levara nos últimos cinco anos. Passara a faculdade em festas e gastara como se não houvesse amanhã, sem ligar para nada além de si mesmo. O que teria sido ótimo, se o dinheiro não tivesse acabado de repente. Bem, na realidade o dinheiro não tinha exatamente acabado: ele ainda era milionário, mas, sem a herança da avó, a grana diminuía. Teria de dizer adeus às viagens impulsivas às Ilhas Cayman, às coberturas de hotéis e às festas de aniversário nas quais esbanjava centenas de milhares de dólares.
Aquele deveria ser o ano em que assumiria os negócios da família.
Em vez disso, vovó desistira da aposentadoria e assumira novamente o controle do conselho da empresa, deixando Joe como mero vice-presidente. Sem o salário de CEO, ele se tornava um pouco... ingrato. Ou seria apenas irritado? Não tinha certeza. Mas precisava de uma bebida forte e de sexo antes de sequer pensar em aparecer no trabalho segunda de manhã. Talvez Sarah estivesse disponível. Ou Natasha. Tinha se divertido com ela, por um tempo.
— Ela está ali! — Vovó apontou a enorme mala rosa com estampa de oncinha. — Vá pegar! Depressa!
Resmungando, ele ergueu a mala da esteira e quase perdeu o equilíbrio.
— Meu Deus! O que você enfiou aqui?
— Ah, você sabe... — Vovó fez um gesto de indiferença. — Uma mulher nunca viaja sem roupas e maquiagem.
— Certo. — Ele encontrou a própria bagagem e a pegou. — Então, cadê a limusine?
— Que limusine? — A avó tirou os óculos de sol Chanel da bolsa.
— A limusine — repetiu Joe. Todo aquele suplício no avião o deixara exausto. — Você acabou de ligar pedindo uma limusine para duas pessoas. Cadê ela?
— Joe, tenho certeza de que existem muitas limusines, onde cabem bem mais que duas pessoas, mas, para ser sincera, não sei do que você está falando. Na realidade, mandei uma mensagem ao motorista, pedindo a ele que ligasse para Demi e a irmã dela.
— E por que você faria uma coisa dessas?
— Porque a pobrezinha estava exausta! — Vovó ficou boquiaberta, apontando para a cara de Joe. — Depois de tudo o que você a fez passar! E pensar! Um bilhete de agradecimento? Agradecendo o quê? Um orgasmo? É isso que os jovens fazem, hoje em dia? — censurou vovó. — A pobrezinha nem se lembra de ter dormido com você. Eu diria que você perdeu o jeito, mas duvido de que algum dia tenha tido, para começar.
— O quê? — explodiu Joe. — Do que você está falando? Posso dar prazer a qualquer uma, quando eu quiser! Sou muito bom em fazer com que as mulheres tenham orgasmos!
Ele ouviu alguns risinhos de desdém, ao que vovó deu tapinhas condescendentes em seu braço.
— Claro que é, meu bem! — respondeu ela. Então se virou para olhar as pessoas que estavam atrás dos dois, moveu os lábios para formar um “desculpe” e deu o braço a Joe.
Como assim Demi não se lembrava de ter transado com ele? Não se lembrava de nada? Sério? Será que ela era maluca? Ele tinha cada detalhe gravado na mente. O cabelo macio, com um aroma suave de lavanda, os gemidos que fazia no fundo da garganta quando ele a beijava. E o gosto... Droga! Homem nenhum conseguiria esquecer o gosto de uma mulher, e tudo em Demi era único, só dela. Levara meses para tirar da cabeça aquele gosto, o jeito como apertara os lençóis entre os dedos e depois o tocara com aquelas mãos habilidosas...
— Sei bem como se sente — sussurrou vovó em seu ouvido. — Também fico um pouco atrevida quando viajo de avião. Você vai superar. Agora, dá para irmos embora antes que todos percebam o efeito que a animação dos aeroportos produz em você? Já foi ruim o bastante ter de ficar aqui ouvindo você gritar “orgasmo”. Deus sabe como já fui paciente com você hoje!
— O quê?
— Joe, as avós sabem das coisas. Tudo bem. Veja só, quando eu tinha a sua idade... — Ela deu uma risadinha. — Uma vez, seu avô e eu fomos ao banheiro do aeroporto... Eles eram menores naquela época, sabe? Bem, eu estava de salto vermelho, na altura perfeita para...
— Vovó, por favor, eu imploro: não diga mais nada! Já é suficientemente ruim o fato de minha imaginação estar a toda. Eu só... só preciso que o dia de hoje acabe. Preciso dormir um pouco antes do trabalho, está bem? Vamos logo para onde quer que você vá ficar hospedada, para que eu possa ir para casa.
Vovó deu de ombros e passou depressa por ele, em direção à rua. Ela estendeu a mão para chamar um táxi e deu as instruções ao motorista enquanto Joe ajudava a pôr a bagagem no porta-malas.
Quando o táxi começou a andar, ele pôde, enfim, relaxar. Vovó estava em silêncio a seu lado, com os olhos fixos na paisagem de Seattle. Joe sabia que aquela era a cidade favorita dela. E por um bom motivo. O ar era fresco e, mesmo sendo uma metrópole, Seattle era cercada de florestas.
A pergunta lhe veio de repente: quando fora a última vez que fizera uma trilha ou apreciara a cidade em que vivia? Nunca. Droga, ele precisava de férias!
Em menos de dez minutos, vovó já estava roncando.
Assim, ao menos parava de gritar obscenidades. Com a sorte que ele tinha, era capaz de ela voltar a falar de orgasmos e saltos vermelhos. Ah, mas que inferno! Ele nunca mais veria sapatos de salto vermelhos da mesma forma.
Deu uma olhada nas mensagens de texto. Algumas eram de Aileen, que errara a grafia de palavras que qualquer pessoa da idade dela deveria saber. Se tinha dificuldades até para enviar uma simples mensagem de texto, talvez não fosse mesmo mulher para namorar. Não que pensasse em, algum dia, contar à vovó que ela estava certa, porque ela usaria a informação contra ele pelo resto da vida.
A última mensagem era de Nick.
Adiantamos a data do casamento. Não queremos esperar. Selena e mamãe estão indo à loucura. Esteja pronto em duas semanas, padrinho!
— Merda! — Joe jogou o celular no banco e xingou mais um pouco.
Vovó se mexeu, mas não acordou.
Como é que iria encarar Selena e Nick, depois de tudo o que tinha acontecido? Selena fora sua melhor amiga a vida inteira, até que... as coisas mudaram. Ele mudou, ela também. As pessoas mudam, não é? Era normal seguir em frente! Era normal deixar amigos para trás. O que não era normal era dormir com esses amigos e depois os abandonar. Joe com certeza tinha problema com compromissos. Odiava o modo como as mulheres reclamavam pela manhã. Pareciam armadilhas mortíferas e grudentas. Que o envolviam com as pernas, beijavam suas costas... Não. Odiava aquilo. Queria apenas um momento com elas. Recusava-se a dar mais que isso.
Porque quando se dava mais de si mesmo, acabava sendo abandonado. Foi assim com Selena e os pais dela.
Eles morreram na noite em que Joe tirara a virgindade da amiga, e ele nunca teve a chance de se desculpar de ter desrespeitado a filha dos dois. Mas, o que era pior, nunca teve a chance de se despedir das pessoas a quem devia tudo o que tinha no mundo. As duas únicas pessoas que sabiam o que ele tinha feito no colégio, que salvaram a vida dele. E então... elas se foram.
A ideia de ir ao casamento deixava Joe desconfortável. O pai de Selena não estava vivo para levá-la até o altar, como ela merecia — mais que qualquer outra pessoa. A pior parte era que Joe estava muito bem vivendo a própria vida, até cometer o erro de pedir a Selena que fingisse ser sua noiva durante um fim de semana. Não imaginara que seria tão afetado por ela.
Mas o golpe final em seu orgulho foi quando Selena se apaixonou por seu irmão mais velho — O que, quando criança, era gago e a infernizava. Era muito injusto!
Queria ajeitar a vida antes do casamento. Precisava.
Afinal de contas, aparência e dinheiro... eram as únicas coisas que tinha. Sabia que não merecia o amor de ninguém e, portanto, nunca pedira amor. Só torcia para que aquela sua falsa segurança durasse o bastante para que ele sobrevivesse às próximas duas semanas e cumprisse as obrigações de padrinho.
Merda! Precisava recomeçar e encontrar outra garota que pudesse levar ao casamento. A julgar pelo naipe das mensagens de Aileen, ela não era mais uma opção. A garota anterior fazia com que ele se lembrasse de Selena, então também não era opção.
Sentiu que uma dor de cabeça estava prestes a despontar, mas a ignorou. Foi quando o táxi virou na saída da rodovia. A saída para a casa dele. A saída para
Lake Washington. Deu de ombros: talvez vovó fosse deixá-lo primeiro.
Quando o táxi parou na casa de Joe, perto do lago, ele desceu, pegou a bagagem e foi se encaminhando para a porta. Não acordaria vovó. Não seria legal. Afinal, ela estava apagada.
Será que isso fazia dele uma má pessoa? Bem, o taxista não a mataria nem nada... Quem mataria uma doce velhinha com baba escorrendo pela...?
— Prontinho! Obrigada! — gritava vovó.
Joe se virou, rezando pela primeira vez em anos, e viu a avó — e as malas da avó — acenando para o táxi, que já desaparecia ao longe.
Quando ia abrir a boca, ouviu:
— Pegue minhas malas! Estou exausta! Onde está meu celular? Viu meu celular, Joe? — Ela vasculhou a bolsa enorme, da qual puxou um iPhone com capa de zebrinha.
Não. Não mesmo. Ela ia ficar na casa dele? Por quanto tempo? Deus, por favor, não permita que seja até o casamento!
— Meu Deus do céu! O casamento é daqui a duas semanas! Temos bastante tempo!
— Tempo? — Aquilo só podia ser punição divina. Ou isso, ou vovó estava possuída. Era impossível decidir a alternativa mais provável.
— Sim. — O sorriso de vovó se suavizou enquanto ela pegava uma das mãos de Joe e a beijava. — Tempo para arruinar sua vida.
— Arruinar? — Joe deu uma risadinha enquanto puxava a mão. — Prefiro ficar... hã... não arruinado. Mas obrigado mesmo assim.
— Como preferir. — Vovó deu de ombros. — Ah, Joe?
— O quê? — grunhiu ele, enquanto levava a pesada bagagem escada acima.
— Você está demitido.
Joe deixou as malas caírem.
— Demitido? — perguntou ele enquanto pontos negros surgiam em sua visão.

*****

Mais um pra vocês.. Acho que até domingo não vou conseguir postar, porque minha família chega aqui amanhã já, mas, de qualquer forma, vou deixar capítulos programados, ok?
Beijos, amo vcs.

30.3.15

Capítulo Quatro




O olhar de Joe por pouco não era capaz de abrir um buraco na parte de trás da cabeça de Demi. Felizmente, toda vez que ela se virava, não era o Joe de sempre que via, mas sua versão suada e inchada — o que destruía a imagem de encarnação do sexo que sempre tivera dele.
Ela acenou.
Ele estreitou os olhos e se sacudiu violentamente no assento — mais uma vez. Demi suspirou e se virou para olhar por cima do ombro direito, na direção do assento da irmã. Notou que Dallas dormia feliz. Será que ela perdera o barraco? Era sem dúvida a pior irmã do mundo!
— Mais vinho. — Vovó Nadine entregou a Demi o copo vazio. Mas o que ela faria com aquilo?
Uma comissária de bordo apareceu do nada e o encheu até a borda. Como alguém conseguia aquele tipo de atendimento em um voo tão curto? Eles nem estavam na primeira classe!
Sem dizer nada, Vovó Nadine pegou o copo plástico das mãos de Demi e tomou um longo gole. Cada milímetro da borda estava coberto de batom vermelho, indicando que o objeto pertencia a ela e a mais ninguém.
Parecia haver mais batom ali que em todos os estandes da Sephora.
— Então, Demi. Sei que Joe é um bundão...
Demi soltou uma risada curta. Vovó Nadine poderia ser sua parceira de voo sempre que quisesse.
— Mas... — A velha senhora interrompeu a frase para outro gole de vinho. — É o meu bundão.
Demi quase engasgou, de tanto que riu.
— Não, calma... — Vovó deu um longo suspiro. — Não quis dizer que ele é meu... Ele é bundão por ele mesmo. Mas foi muito mimado por mim quando criança. O garoto tinha medo de tudo, sabe?
— Ah, é mesmo? — Demi fingiu desinteresse, apesar de a revelação ter feito seu coração bater com força. — Não sabia.
— Ah, querida!
Vovó riu. — Ele tinha medo da própria sombra, quando garoto! Dormiu na cama dos pais até os seis anos!
Coitados dos pais de Joe.
— De qualquer modo... — Vovó deu mais um gole no vinho. As joias que usava no pulso tiniam quando ela gesticulava ao falar. — É meu trabalho, minha missão, fazer o melhor por ele. Ajudá-lo no percurso, fazer dele o homem que deveria ser, antes que seja tarde demais.
— A senhora está doente? — sussurrou Demi, sentindo o coração apertado.
— Eu? — Vovó deu uma risada. — Ah, querida! Deus ainda não me quer do lado dele! Ele me contou isso hoje mesmo, pela manhã.
Então vovó tinha conversado com Deus. Demi se perguntou se a conversa significava que ela também estava tentando salvar a alma de Joe.
— Então... — Demi soltou o ar e esfregou as mãos nas calças. — Qual é o plano?
— Ah. — Vovó esvaziou o copo tal qual faria uma estrela do rock e o devolveu a Demi. — Isso é fácil. Já o deserdei. Joe conta apenas com o que tem na poupança. Também o demiti. Embora ele ainda não saiba.
— Hum.
— Que gracinha. — Vovó deu tapinhas na perna de Demi. — Percebi que você ficou preocupada com ele. Não fique. Depois disso, Joe vai pôr os pés no chão. Em uma situação difícil, os bundões sempre caem em pé. — Ela hesitou. — Ou será que são os gatos? — A velha senhora sacudiu a cabeça com o dedo no queixo, confusa. — Bem, de qualquer jeito... ele vai ficar bem.
— Então é para o bem de Joe que você está arruinando a vida dele? — perguntou Demi.
— Isso mesmo.
Vovó curvou o tronco para a frente, e os seios vistosos extravasaram um pouco do longo decote em V.
Como ela conseguia manter um corpo daqueles? Sério.
Vovó Nadine era simplesmente incrível.
— Todo o mundo, todo o mundo mesmo, merece ter a vida arruinada — disse vovó, sorrindo e colocando uma das mãos perfeitamente feitas no braço de Demi. — Isso mantém as pessoas agradecidas. Vou arruinar a vida de Joe, e, no fim, ele vai ficar agradecido, feliz, satisfeito e... — Ela olhou para trás. — Não com essa aparência pior que o pecado. Ah, bom Deus! Aquele rapaz era lindo! Agora usa um negócio no cabelo, faz limpeza de pele e... — Vovó deu de ombros. — Ruína e imundice. Ele terá os dois. Quando eu terminar, Joe nem vai saber o que aconteceu a ele. E, se isso não funcionar... — Fascinada, Demi mal podia esperar para ouvir que pérola de sabedoria sairia da boca de vovó Nadine em seguida. — Bem, sempre tem o seminário religioso.
— A senhora o mandaria para um seminário religioso?
— Mas é claro que não! — Vovó levou uma das mãos ao peito, ofendida. — Ele que se ofereceria para ir, para me deixar feliz e poder novamente contar com as minhas boas graças. E com as graças de Deus, que não podemos nos esquecer d’Ele! Já faz anos que Joe O irrita. Que Deus abençoe esse coração galinha!
— Ah, acho que a senhora não deveria dizer “galinha” e “Deus” na mesma frase.
— Besteira! — Vovó fez um gesto de indiferença. — Estou exausta. Vou descansar os olhos. Boa noite.
Parecia que a conversa tinha terminado. Ou isso, ou as três taças de vinho tinham derrubado vovó, que em questão de segundos começou a roncar. O avião pousou vinte minutos depois, encerrando o voo mais apavorante e estranho da vida de Demi.
No instante em que o aviso de AFIVELAR OS CINTOS apagou, Demi pulou do assento. Vovó acordou e bocejou.
— Já chegamos?
— Já. — Demi estava tentando não ser mal-educada, mas só pensava em deixar aquele pesadelo para trás.
Voltou o mais rápido que pôde para seu assento original, onde Dallas esperava pacientemente.
— Precisamos ir agora mesmo! — ordenou Demi. — Pegue nossas coisas. Não queremos que vovó Nadine pense que...
— Demi! — gritou uma voz feminina familiar. — Demi! Preciso de ajuda!
Em pânico, Demi foi direto até vovó, passando inclusive por cima de outros assentos. A velha senhora esperava serenamente em seu assento.
— O que foi? É o coração? Está passando mal? Está...
— Minhas malas estão pesadas, e acho que bebi demais.
O que era a constatação do século. Vovó Nadine tinha bebido três taças de vinho em menos de vinte minutos.
Na última vez que bebeu tanto assim, Demi acabou com a cara enfiada em uma cama de cachorro, ao lado de um labrador chamado Lúcifer, que com certeza se aproveitara dela durante a noite, a julgar por todo o pelo que havia em sua boca.
— Pode carregar para mim? — Vovó Nadine deu um sorriso tão doce que ela não teve escolha. E foi assim que, uma hora depois, Demi estava na área de restituição de bagagens ao lado de Dallas, de vovó e de um Joe bastante inchado.

*****

Desculpa não ter postado, não passei o fim de semana em casa.
Respostas aqui.
Amo vcs, beijo.

27.3.15

Capítulo Três




Carma. Ah, como ele odiava o carma! Era isso que estava acontecendo com ele. Afinal de contas, um cara só pode galinhar pelo mundo até certo ponto: alguma hora Deus começa a castigar, a matar ou, no caso de Joe, a lançar a praga das mulheres sentimentais.
— Eu não... — Joe limpou a garganta e continuou, em um sussurro: — Não foi um acidente. Esta mulher aqui é que me atacou. — Ele apontou para Demi.
A comissária de bordo olhou para os dois:
— Com o quê, senhor?
— Água — respondeu vovó no lugar dele. — Ela jogou água nele.
— Hã... — A moça se remexeu, nervosa. — E por acaso o senhor... Quer dizer, o senhor quer apresentar queixa?
— A quem? — Demi riu. — A que autoridade? E o que ele vai fazer? Usar uma arma de choque em mim, por eu ter jogado água na parte do corpo favorita desse senhor? — Ela apontou para a cara de Joe e riu. — Sério!? Não é como se eu tivesse dito “bomba”.
— Ah, droga! — Pressionando o ponto entre os olhos, Joe se pôs a ouvir enquanto a palavra “bomba” era repetida aos murmúrios nas várias poltronas atrás dele.
Em pouco tempo, como se literalmente atingido por uma bomba, todo o avião ficou imerso em caos.
— Senhora! — A comissária de bordo ergueu as mãos diante de Demi. — Fique calma. Preciso que a senhora fique calma. Por acaso está com uma bomba?
— O quê? — Ela pareceu confusa. — Por que eu estaria com uma bomba?
Bom. Ao menos Demi tinha o bom senso de parar de falar quando...
— E se eu estivesse com uma, acha que seria idiota a ponto de ficar gritando isso por aí?
Alarme falso. Aquela mulher não tinha bom senso, nem fazia o menor sentido. Como ele pôde esquecer?
Estava falando de Demi. Ela adotava cachorros cegos e chorava durante os comerciais idiotas da cantora Sarah McLachlin sobre resgate de animais. Estava claro que bom senso não era um de seus pontos fortes.
— Senhora! Preciso que pare de gritar. — A comissária de bordo gesticulou para alguém atrás de si.
Em questão de segundos, surgiu um homem de jeans e camisa branca. Bem, não parecia justo chamá-lo de homem, apenas, já que era bem provável que o cara comesse criancinhas no jantar. Até Joe se remexeu na poltrona, pouco à vontade, e evitou contato visual com o desconhecido.
— É você que está dizendo que vai bombardear o avião? — perguntou o homem.
— O quê!? — Demi olhou para Joe, pedindo ajuda. E, para ser sincero, ajudá-la parecia ser a coisa certa a fazer, apesar de tudo.
Mas aquela mulher tinha acabado de jogar água nele e de acusá-lo de ter sofrido um “acidente”.
E teve também aquela vez, ainda no ensino médio, que ela espalhou o boato de que Joe não praticava esportes porque tinha medo de que, quando estivesse nu no
vestiário, alguém descobrisse que ele tinha partes íntimas femininas.
Então talvez ele não estivesse muito propenso a ajudar.
— Joe! — Demi acertou-o no ombro. — Ajude aqui!
Com um sorriso maldoso, ele ia começar a responder, mas vovó tapou sua boca antes que desse tempo de falar.
— São esses dois. Os dois têm bombas. — Assim que disse isso, vovó Nadine começou a chorar.
Lágrimas de verdade.
No instante imediato, Joe teve as mãos atadas por um lacres de segurança e, na sequência, viu-se forçado a comer amendoins, que lhe foram dados por um homem cujas mãos eram maiores que seu rosto, porque ele quase desmaiou. Ah, que ótimo, um colapso nervoso!
Este era só mais um acontecimento a somar aos que deviam estar sendo os piores meses de sua vida!
Antes do quase desmaio, a última coisa de que se lembrava era de ter ouvido Demi falar alguma idiotice sobre ele estar precisando de proteínas. E, por algum motivo — talvez porque tudo estivesse girando —, Joe não conseguiu abrir a boca a tempo de dizer que odiava amendoins.
Agora, ele tentava se decidir sobre o que seria pior: o fato de haver um homem forçando algo para dentro de seu corpo, ou o fato de os dedos desse homem serem mais macios que qualquer outra coisa que ele já tenha sentido tocar seus lábios. O que trazia à tona a grande questão: para começo de conversa, por que aqueles dedos estavam roçando seus lábios? E por que pareciam tão...?
Mas que droga! Joe apertou os apoios de braço do assento e fez uma careta. Será que ele estava mudando de time?
— Chega desse amor.... Quer dizer, amendoim! — Merda.
Demi espiou por cima do homem e pareceu espantada.
— Você acabou de dizer “chega desse am...”.
— Não! — Joe forçou uma risada e tentou se afastar o máximo possível do homem, que estava sentado entre os dois. — Eu disse “amendoim”.
— Não disse, não. — Demi abriu um sorriso.
— Disse, sim.
— Não, não disse.
— Por favor, podem tirar esse negócio de mim? — perguntou Joe, batendo nos descansos de braço. Os lacres não afrouxavam de jeito nenhum e já estavam deixando marcas. — Não estamos carregando bombas! Minha avó é louca! De verdade! Vocês não têm ideia do que ela é capaz.
— E a fruta não caiu muito longe da árvore — resmungou Demi.
— Você pode parar? — Joe espiou por cima do agente de segurança. — Estou tentando tirar a gente dessa situação. O mínimo que você podia fazer era ajudar, ou pelo menos se desculpar!
— Me desculpar? — Demi arregalou os olhos. — Me desculpar? — Suas narinas inflaram quando ela se inclinou o máximo que os lacres permitiram e lançou um olhar de fúria para Joe. — Estou surpresa por você ao menos saber que essa palavra existe!
Joe bufou com desdém.
— Sei que existe, mas não sou eu o culpado, aqui.
— Deus do céu! Tenho vontade de dar um tapa no seu rosto com tanta força que...
— Dar um tapa no meu rosto? Que idiota fala desse jeito? A velha Demi de sempre, que só fala, mas não faz nada. Além disso, suas mãos estão literalmente atadas. Posso falar o que quiser, e você vai ter que ficar aí sentada me ouvindo. Na verdade...
Joe parou de falar e direcionou para Demi todo o efeito de seu sorriso de astro de cinema, brilhante como mil sóis. Os dentes brancos e perfeitamente alinhados se destacaram no rosto quando ele umedeceu o lábio inferior, lentamente, e se inclinou, provocador. Uma mecha de cabelo escuro caiu sobre um de seus olhos.
Droga, aquele homem era tão atraente que era quase um crime!
— Não me venha com essa, Joseph Jonas! Não se atreva. Eu vou, eu vou...
Joe abriu um bocejo.
— Estou esperando.
— Eu vou...
Então foi isso que aconteceu: Joe se virou para o agente de segurança e tentou pigarrear, mas, por algum motivo, não conseguiu. De repente, foi como se ele tivesse engolido algodão, era o que parecia.
Dem... — Sua língua parecia enorme. — Demi, eu...
— Meu Deus! — gritou Demi, debatendo-se na poltrona. — Ah... Joe! Ah... Senhor Agente de Segurança!
— Randall. Eu me chamo Randall. — O homem estendeu a mão e, ao perceber que Demi estava algemada, riu. O agente de segurança não conseguia ver o que estava acontecendo com Joe. Estranho... era quase como se ele não estivesse conseguindo respirar.
Talvez fosse por causa da altitude. Ele tentou engolir a saliva outra vez. Merda. Estava cada vez mais difícil respirar. Mas o que era aquilo?
— Joe! — gritou Demi, dessa vez mais alto. Então deu um chute no agente, para conseguir sua atenção. — Veja bem... Randall? Estamos com um problema. Você tem cinco segundos para evitar que uma pessoa morra sob sua supervisão.
Morror! — Fez Joe. Meu Deus do céu! Demi ia matá-lo? O avião estava caindo? Bem, não era como se ele tivesse muitos motivos pelos quais viver, agora que a avó ameaçara acabar com sua carreira caso ele não tomasse jeito. Era morrer nas mãos dela ou, ao que parecia, nas mãos de alguma outra mulher rejeitada.
Preferia tentar a sorte com Demi a enfrentar a ira de uma mulher de 86 anos que usava batom suficiente para riscar o contorno do cadáver do neto e poupar o trabalho da polícia.
Já até podia ver a manchete do jornal: “Joseph Jonas, playboyzinho milionário, deserdado pela família, morre em acidente de avião com migalhas de amendoim por todo o rosto.” Não que fossem encontrar as migalhas, considerando que seu corpo provavelmente seria incinerado e... Quando foi que sua vida tinha ficado tão deprimente?
Ele culpava o casamento iminente do irmão. Tudo fora ladeira abaixo desde que seu irmão pedira em casamento sua melhor amiga de infância.
— Perdão? — O agente de segurança se endireitou, o que arrancou Joe do estado distraído de sonhar acordado. Ou, melhor dizendo, de ter pesadelos acordado.
— Olhe! — Demi indicou Joe com a cabeça.
Então era assim que ele ia morrer? Pelas mãos de Demi, uma mulher rejeitada. Bem, na prática seria pelas mãos perturbadoramente macias do agente de segurança aérea que o fizera comer amendoins. Como será mesmo que sua vida tinha virado uma novela mexicana, hem?
— Senhor, acalme-se. — O agente arregalou os olhos, levantou-se e bateu a cabeça no teto, então praguejou e saiu correndo. Joe o seguiu com o olhar. Caramba.
Qual era o problema dele? Será que estava assim tão preocupado com a ameaça de morte de Joe?
Ha-ha — disse ele. — É ixo aí. E ahora? Voxê vai me envenenar? Foi mal, gaota, eu meio que extou do ado xerto da perfeixão.
Os lábios carnudos de Demi se contorceram em um sorriso desdenhoso.
— É, lá se vão minhas desculpas.
— Por que motivo? — Joe se endireitou no assento.
Mexendo-se um pouco, talvez conseguisse respirar melhor.
Demi soltou um xingamento abafado, deu de ombros e olhou para o outro lado.
Estava quente naquele avião? O que estava acontecendo com sua boca? Suas mãos tinham começado a coçar muito. Ele olhou para baixo e ficou atônito, encarando as mãos.
Elas estavam muito inchadas, como as do Mickey Mouse.
— MAX QUE DROGA! — Ele se debateu com violência. — Mia mon, mia mon!
— Mon? — Uma senhora se virou para encarar os dois.
Demi assentiu solenemente.
— Por favor, perdoe meu amigo. Ele acha que fala francês.
O pânico crescia à medida que ficava mais difícil respirar. Será que ele estava sofrendo uma reação alérgica, ou apenas surtando? Nunca antes passara por nada parecido com isto que sentia agora. Olhou para o corredor e notou que vovó chegava trazendo alguma coisa. Ótimo. Era só o que faltava: ser esfaqueado pela própria avó! Será que suas experiências em aviões nunca seriam normais?
— Não se preocupe, Joe. — A velha senhora apontou para ele e assentiu com a cabeça. — Vovó vai cuidar disso. — Ela ergueu uma das mãos. Joe fechou os olhos. Talvez fosse só um pesadelo. Talvez suas mãos não estivessem realmente algemadas. Talvez ele estivesse sofrendo um colapso nervoso e...
Fia da mõe! — gritou Joe quando vovó cravou a agulha em sua coxa, aproveitando-se do buraco na calça jeans. Bem, se não morresse, com certeza ele iria desmaiar de dor. Só coisas boas o esperavam...
Quando a pressão diminuiu e a agulha desapareceu — graças a Deus! —, ele abriu um olho, depois o outro, e viu que vovó estava parada à sua frente, segurando o que só poderia ser descrito como um instrumento de tortura.
— Ele era alérgico quando criança. Acho que foi o estresse... — Ela fez um som que parecia querer dizer “Puxa vida, tadinho!” e se virou para Demi. — Obrigada, querida. Não sei o que teria acontecido se você não tivesse avisado a Randall que Joe estava prestes a morrer.
— Você salvou o dia, senhora. — O lábio inferior de Randall tremia e ele assentia com a cabeça, olhando para o chão.
Vocês só podem estar de brincadeira.
Todos voltaram a atenção para Joe.
Ele podia jurar que o avião inteiro tinha mergulhado em um silêncio mortal. Um silêncio bem curto, na verdade, já que o voo de Portland a Seattle durava menos de uma hora.
— Joe. — Vovó suspirou. — Não tem nada que você queira dizer a Demi?
Você é louca? Você quase me matou? Vou estrangular você? Resmungando, ele se virou para olhar a mulher, olhá-la de verdade. Mas que droga! Ela ainda era irritantemente linda. Joe quase podia sentir aquele cabelo sedoso correndo entre seus dedos. E aquela boca? Era o bastante para distrair um homem. Até mesmo agora, do modo mesmo como estava, queria tocar aqueles lábios e...
No que estava pensando?
Devia ser a alergia.
O longo cabelo castanho-avermelhado de Demi caía em ondas sobre os ombros. Ela arregalou os olhos castanhos um pouquinho quando o olhar de Joe se fixou em seus lábios carnudos e rosados. Mas não foi uma reação de preocupação. Quando muito, parecia que ela estava tentando não rir.
— Não, nada que eu queira dizer. — Joe lançou um olhar irritado para a mulher. — Acho que Demi sabe exatamente como me sinto a respeito dela.
O sorriso da jovem se desfez ao mesmo tempo que seus olhos ficaram gélidos.
— Ele está certo. — Demi voltou a olhar para vovó. — Ele já disse tudo o que precisava na noite em que, depois de dormir comigo, foi embora e deixou no travesseiro um bilhete de agradecimento. Não foi, Joe?
Ele deveria ter imaginado que aquele tapa viria. Mas a verdade é que ainda estava chocado com o fato de Demi ter decidido lavar a roupa suja diante de todos os passageiros do avião.
Então, quando sentiu o ar assobiar na orelha, fez o que qualquer homem teria feito: ele se curvou. Pena que vovó não era de desistir facilmente.
O segundo tapa foi com as costas da mão e doeu pra caramba.
— Não foi assim que criei você! — Vovó Nadine enfiou o dedo na cara de Joe e sacudiu a cabeça.
Bufando, ela ajeitou o casaco e ordenou que Randall, o agente de segurança chorão, soltasse Demi, explicando que não tinha sido ela que causara o problema, e sim Joe. Sentindo-se injustiçado, o neto começou a gritar com o agente, dizendo que fora Demi quem dissera “bomba”, mas repetir a palavra só piorou a situação.
Mas o golpe final foi quando vovó olhou Randall nos olhos e disse:
— Ela salvou a vida de Joe.
A hora seguinte foi a mais longa de sua vida.
A respiração estava seca. O rosto provavelmente continuava inchado, consequência tanto da reação alérgica quanto do tapa da avó. Nunca se sentira menos homem que naquele momento. E era tudo culpa de Demi.

*****

Eu to adorando postar essa fic jazjsxja
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Se cuidem, amo vcs, bjs 

26.3.15

Capítulo Dois




— Respire, Demi. Respire. Inspire, expire... pronto.
Demi tentava normalizar a respiração, mas estava tendo bastante dificuldade, pois sua irmã lhe dava tapas nas costas sempre que ela abria a boca.
— Passe o saco de papel. — Demi arrancou o saco das mãos da irmã e começou a respirar ali dentro, devagar. Finalmente, depois de dois minutos pensando que fosse morrer, o ataque de pânico passou.
— Melhor? — sussurrou Dallas.
— Não. — Demi mordeu o lábio e olhou para o corredor. O mesmíssimo corredor por onde, minutos antes, Joseph Jonas passara. Ele chegara a olhar para ela e abrir um sorriso educado antes de continuar o caminho até seu assento.
Um sorriso.
Era tudo o que ela merecia. Um sorriso educado. O fato de o avião ter escolhido aquele exato momento para passar pela maior turbulência da história só piorou as coisas.
Mas a cereja do bolo, o que realmente fez com que aquele fosse o pior dia de sua vida, foi quando os peitos da comissária de bordo acidentalmente — até parece! — pularam da blusa e bateram bem na cara de Joe.
Aquele homem precisava ser castrado. Ele era a encarnação do sexo, e todos ao seu redor ficavam cientes disso. Mesmo Joe não sendo uma celebridade, as mulheres se sentiam atraídas para ele como ratos para o queijo.
E ela já tinha sido um desses ratos.
— Babaca! — murmurou para si mesma, cerrando os punhos.
Mas aquilo fora anos atrás. Ela já estava calejada.
Além de mais forte e mais sábia.
Sim, mais forte. Era uma figura pública, pelo amor de Deus! Tinha capacidade de agir como se estivesse tudo bem, e era exatamente isso que iria fazer.
E estava mesmo tudo bem.
Tudo muito, muito, muito bem.
— Demi? — Dallas a cutucou. — Você está se balançando para a frente e para trás de novo. Quer que eu pegue o saco?
— Não precisa. — Demi sentiu os lábios se abrirem em um sorriso. — Já volto.
Dallas estendeu o braço para bloquear a saída da irmã.
— Não. Não mesmo. Você está com aquela cara de louca. E eu realmente não quero que você seja presa. Como sua irmã e futura dama de honra, não vou me perdoar se eu deixar que você passe.
— Compro uma bolsa Louis Vuitton para você.
— Por outro lado... você é adulta e pode tomar as próprias decisões. Pode ir! — Dallas ergueu o braço. — Preta. Vou querer a preta.
Demi revirou os olhos e andou até o assento de Joe.
O aviso de AFIVELAR OS CINTOS não estava mais aceso, então Demi estava liberada. Tinha praticado aquele discurso desde o encontro fatal no ano anterior. Ela queria mais que um casinho de uma noite, e Joe... Bem, ele queria um casinho de uma noite e um “obrigada!”.
Demi nunca contou nada a Selena, a amiga em comum, e jurou que levaria o segredo para o túmulo. Quer dizer, a não ser que visse Joe outra vez, o que mudaria tudo.
Ela já tinha se perguntado o que diria se o encontrasse de novo. Como ele reagiria? Será que pediria desculpas por ter sido um babaca? Ou que nem mesmo se lembraria dela? Parecia que ele nem a tinha reconhecido!
Tudo bem que ela estava com o cabelo mais comprido, mas rostos não mudam.
Infelizmente.
Ela teria mesmo era de pedir a mudança a Deus. Joe, porém, precisava de mais que uma cara nova: precisava era de um coração naquele corpo musculoso!
Demi olhou os passageiros que estavam sentados algumas fileiras atrás dele. Havia um copo d’água na mesinha reclinável em frente a uma garota.
— Oi, querida, posso pegar isto aqui?
— Ah, meu Deus! — A garota, que parecia ter uns 12 anos, começou a bater palmas, animada. — Você não é aquela mulher do noticiário?
— Sou, sim. — Demi costumava adorar quando era reconhecida, mas não naquele momento. Precisava passar despercebida. Tentou ignorar o sorriso animado no rosto da garota, mas falhou. Aceitando o destino, puxou conversa. — Você deve assistir bastante ao noticiário, hem?
— Não. — A garota soltou um suspiro. — Mas mamãe e papai riram bastante naquela vez que você caiu da cadeira. Disseram que aquilo tinha acontecido por causa de bebida.
Ah, que maravilha! Será que todo o mundo tinha visto aquele vídeo no YouTube? A gravação fora na noite seguinte ao encontro com Joe. Os dois só saíram porque ela ficara com pena dele, o que tinha sido a primeira decisão ruim, logo sucedida pela segunda: levar uma garrafa de tequila e acordar em um quarto de hotel sem nada além de um bilhete de agradecimento e uma ressaca pavorosa. Por sorte conseguira chegar ao trabalho na hora certa.
Mas não fora por sorte que tivera dois milhões de visualizações no YouTube e recebera convite para participar do programa Today, apresentado por Kathie Lee e Hoda, que, em vez do vinho habitual, educadamente serviram a Demi shots de tequila, em homenagem à noite de horrores de sua convidada.
— Eu não estava bêbada — explicou ela. — Eu estava... cansada, estressada com o trabalho e... — Meu Deus! Ela ia mesmo perder a cabeça diante de uma garota de 12 anos? — Quer saber? Não importa. Que tal ganhar cinco pratas?
— Cinco pratas?
— Me dê essa água que eu lhe dou cinco pratas.
— Quero dez.
Demi a olhou feio.
A garota retribuiu o olhar. Certo. Dez dólares pela chance de se sentir melhor quanto ao fato de Joe ter sido um babaca? Feito. Negócio fechado!
Enfiou a mão no bolso de trás e retirou uma nota de vinte. Droga.
A garota arrancou a nota de suas mãos antes que ela tivesse a chance de fazer qualquer coisa. Resmungando, Demi pegou o copo e foi até o assento de Joe.
Mais duas fileiras.
Finalmente. Demi parou ao lado de Joe e pigarreou.
Ele não olhou para cima.
Ela pigarreou outra vez.
Enfim ele levantou a cabeça, bem devagar. Ficou de queixo caído.
— Demi?
— Joe — ronronou ela.
— Como vai? Quer dizer, faz tanto tempo! — O sorriso de Joe não chegou aos olhos.
Na verdade, fazia onze meses, uma semana e cinco dias. Mas quem é que estava contando? Não ela.
— Faz mesmo, não é? — Ela se apoiou no assento.
— A gente devia sair e botar o papo em dia! — Ele a olhou de cima a baixo antes de tossir e desviar o olhar.
— Devia mesmo — concordou ela e, antes de perder a coragem, derramou toda a água do copo bem na calça dele. — Mas não saio com idiotas que me abandonam depois do sexo.
— Mas que...
Ele começou a se levantar bem no momento em que Demi apertava o botão para chamar um comissário de bordo.
— Oi, desculpe-me. Parece que Joseph Jonas acabou de fazer xixi nas calças. Você poderia nos ajudar?
Ao redor dos dois, era possível ouvir risadinhas abafadas, e Demi sorriu para Joe, que estava boquiaberto. Ele estendeu a mão na direção de uma senhora distinta que estava sentada ao seu lado.
— Ora, ora! — Demi se apoiou na poltrona e sussurrou: — Parece que hoje em dia você vai atrás de todo tipo de mulher, não é mesmo?
— Ah, vai mesmo — concordou a senhora. — Sabia que ele teve coragem de levar uma vagabunda à festa de noivado do irmão?
Deus queira que essa senhora esteja falando de outra pessoa, não de si mesma!
— Eu, hã... — Demi precisou de um momento para se recuperar. — Na verdade, acredito sim.
— E sabe o que mais? — A mulher se inclinou sobre a poltrona do neto, desvencilhando-se de sua mão. Joe revirou os olhos, mas ficou em silêncio.
— O quê? — Quem quer que fosse aquela louca, Demi gostava dela. Muito. Pena que Joe fosse partir seu coração. Sem querer julgar, mas... sério que ele saía com mulheres com mais que o dobro da idade dele?
— A namoradinha dos tempos de escola vai se casar com o irmão dele. Ele tenta fingir que não liga, mas uma avó percebe a verdade. — Ela deu um tapinha na mão de Joe.
Ah... avó? Espere aí. Aquela era a famosa vovó Nadine, de quem Selena sempre falava? Mesmo tendo crescido relativamente próxima da família Jonas, Demi nunca chegara a conhecer a senhora... até então.
— Então... — Vovó se recostou na poltrona. — Vou dar um jeito nele.
Joe gemeu.
— Quer dizer que vai castrá-lo?
— Ah, querida. — Vovó quase engasgou de tanto rir. — Castração é a melhor coisa que poderia acontecer a esse garoto. Sabia que até já procurei um cinto de castidade?
Joe gemeu outra vez.
— Meu Deus, salve-me do sexo feminino!
— Sexo. — Demi bufou com desdém. — Foi isso que o deixou nesta situação, não foi?
E neste exato momento a comissária de bordo escolheu se aproximar.
— Onde está o rapazinho que molhou as calças? — Ela trazia nas mãos um belo par de fraldas.
Vovó e Demi apontaram para Joe.

*****

To feliz que vocês estejam aprovando a história askjnmzai vovó é uma comédia, não?
Como vocês puderam perceber, os capítulos são bem pequenos, então, se vocês comentarem bonitinho, eu posto capítulos duplos, como fiz com o prólogo..
Respostas aqui.
Amo vcs, beijos 

25.3.15

Prólogo e Capítulo Um




Verão de 2002
— Joe! Me segura! Me segura! — gritou Demi, preparando-se para cair de costas durante o exercício de confiança no acampamento do último ano do ensino fundamental.
Fazia anos que tinha uma quedinha por Joe. Agora que estava terminando o nono ano e começaria o ensino médio no outono, as coisas pareciam estar melhorando.
De pernas depiladas, novo batom rosa nos lábios e um rabo de cavalo alto, ela sabia que estava bonita. E Joe logo, logo saberia também, assim que ela caísse
(literalmente) em seus braços.
— Hã... ok — respondeu Joe, atrás dela. — Estou quase pronto.
— Ok. — Sentindo-se nervosa de repente, Demi respirou fundo algumas vezes. — Vou cair!
— Pode vir! — avisou Joe.
Demi sentiu o vento nas costas quando endireitou o corpo e se jogou para trás. Mas não parou de cair: não havia nada que a pudesse amparar. Bateu na grama com um baque e olhou para cima.
Amy Stevens enrolava uma mecha de cabelo entre os dedos, rindo de algo que Joe dizia. Aquele cara tinha a capacidade de concentração de um peixinho-dourado!
— Seu babaca! — Demi bateu com o punho no chão. — Joe? Somos parceiros, e existe um motivo para o fato de essa atividade se chamar exercício de confiança! Você deveria ter me segurado!
Ele arregalou os olhos.
— Ai, droga! Me desculpe, Demi. Amy não sabia o que era para fazer e não tinha parceiro, então eu disse que ela poderia ficar com a gente.
— Ah, mas...
— Nossa, Joe, ainda bem que me ofereci para ser sua parceira! Vamos precisar de duas pessoas para segurar essa garota. Ela parece uma baleia inchada. — Amy riu e cutucou Joe, o que fez o estômago de Demi embrulhar. Ela sabia que não era tão magra quanto Amy ou as outras garotas. Umedeceu os lábios, insegura, e sofreu a dor da rejeição que se abateu sobre ela.
Enquanto o silêncio se prolongava, sentiu as lágrimas que brotavam e um nó na garganta.
Demi olhou para ele, que estava com as bochechas um pouco vermelhas, mas Joe não disse nem uma palavra.
Ele não a defendeu. Ele não fez nada.
Talvez essa tenha sido a pior parte.
A total falta de reação.
Ele poderia ter rido da piada também. Isso ao menos deixaria Demi irritada o suficiente para socar a cara dele.
Em vez disso, Joe a olhou com pena, como se o que Amy dissera fosse verdade.
Como se concordasse com aquilo, mas não soubesse de que modo dizer isso a ela.
Demi sentiu os olhos se encherem de lágrimas, então os baixou à grama, que já lhe causava coceira.
— E aí, gente, estão prontos para o exercício?
Selena foi até eles e sorriu, deixando Demi ainda mais insegura. A única garota em quem Joe confiava era Selena. Demi e Joe compartilhavam a melhor amiga, o que era uma droga, na opinião de Demi. Fazia com que ela sempre se sentisse sobrando, como se fosse um brinquedo estranho e com defeito, que nunca se encaixava em lugar nenhum.
Joe abraçou a recém-chegada.
— Estávamos só aquecendo.
— Legal. — Selena olhou para Demi. — Vamos lá! Levante-se daí, preguiçosa!
Amy caiu na gargalhada.
— Exercício, Demi. Já ouviu falar nisso?
Selena olhou de cara feia para Amy e estendeu a mão para Demi.
— Ignore. Ela só está chateada porque seus peitos são maiores que os dela.
Revirando os olhos, Demi se levantou e deu uma última olhada na direção de Joe. Era o fim da quedinha que sentia por ele. De verdade. Afinal, que garota quer se apaixonar por um cara que não a resgata quando ela mais precisa dele?
Ela queria um homem como os que via nos filmes e na TV. Um herói de verdade, que a salvasse. Homens de verdade usavam armas e espadas para lutar pelas mulheres que amavam. No ano anterior, quando a turma assistiu ao filme Romeu e Julieta, Demi precisou esconder as lágrimas que escorriam por seu rosto durante a última cena. Era aquilo que ela queria: um homem tão apaixonado que a seguisse até o outro mundo! Na época, quando disse aquilo em voz alta, Joe a olhou como se ela fosse maluca. Bem, ele é que iria se dar mal, no final das contas! Demi encontraria o homem da sua vida! E, por ela, Joseph Jonas poderia... morrer.

Capítulo 1
Dias de hoje
— Vovó, que merda você está fazendo? — Enquanto pegava as duas malas gigantescas, a enorme bolsa Coach rosa e o que mais parecia um animal morto que por vezes andava pendurado na cabeça da avó, Joe praguejava mais uma vez.
— Olhe a língua, Joe! — Vovó Nadine ergueu os ombros e o empurrou, abrindo caminho até o guichê de passagens.
Ah, não. Não mesmo. Pelo amor de Deus, não! Joe olhou ao redor à procura de Aileen, sua última conquista amorosa, que o acompanhara na festa de noivado de seu irmão, Nick.
— Sim, preciso de uma passagem só de ida — anunciou vovó em voz alta, dirigindo-se à atendente da companhia aérea Alaska Airlines. Joe assistia à cena com um misto de horror e pânico enquanto a avó comprava um assento no mesmo voo dele. Tomara que o cartão seja recusado. Tomara. Tomara.
— Aqui está — disse a atendente maligna ao entregar o cartão de embarque e sorrir. Joe a encarou, irritado.
Depois encarou a avó.
— Não. — Ele balançou a cabeça quando vovó Nadine se aproximou, risonha. — Você não vai — sustentou Joe. E cruzou os braços, firme.
— Vou, sim. — Vovó sacudiu o cartão de embarque bem na cara dele e sorriu. — Agora pegue as minhas malas.
— Mas...
— Joey? — Aileen foi até ele, quase desfilando.
Vestindo uma saia do tamanho que não deveria ser permitido em lugares públicos, especialmente em aeroportos, ela ajeitou o penteado e parou ao seu lado. O cabelo tingido de loiro se mantinha no lugar com o uso de ao menos duas latas de spray fixador e, a julgar por sua incapacidade de andar em linha reta, Aileen ainda trazia a embriaguez da noite anterior.
Vovó abriu um sorriso.
— Que maravilha! Parece que sua vagabunda chegou.
Joe grunhiu e cobriu o rosto com as mãos. Não tinha como sair dessa. Sua avó acabaria fazendo com que ele levasse um tiro.
Terra da vingança feminina, aqui vou eu.
— O que você disse? — Aileen colocou as mãos na cintura e balançou a cabeça para vovó de um jeito estranho, quase caindo dos saltos. Ah, aquilo não era bom! Não era nada bom.
Vovó deu um tapinha simpático no braço da jovem.
— Queridinha, sou eu que preciso de aparelho auditivo, não você. Acabei de chamá-la de vagabunda. Quer que eu soletre? — A velha senhora cutucou Joe. — De onde saiu essa? Da feira de empregos para nível médio? — Então, vovó começou a soletrar a plenos pulmões: — V-A-G-A-B-U-N-D-A.
Ela estava mesmo soletrando “vagabunda” em um aeroporto internacional? E ainda por cima para a namorada dele? Ou melhor, caso? O que Aileen era, afinal?
Droga, ele nem sabia o sobrenome dela!
O que devia ser um mau sinal.
— Pois saiba que...
— Joe, estou com fome. Me leve para comer. — Vovó enlaçou o braço no dele e começou a puxá-lo em direção aos seguranças com mais força do que deveria ter uma mulher de 86 anos.
— Mas e eu? — Atrás dos dois, Aileen fez beicinho.
Vovó parou de andar e se virou.
— Queridinha, tenho certeza de que você é capaz de encontrar outra excelente distração até a hora do voo. Este aqui já tem dona.
Aileen bufou.
— Não achei que seu gosto fosse tão duvidoso — disse para Joe.
Ele abriu a boca para explicar “Essa é a minha avó”.
Porém, antes que tivesse tempo de falar, a avó lhe deu um grande beijo na bochecha e beliscou seu traseiro.
— Ah, queridinha! Você nem imagina do que esse aqui gosta! — E deu uma piscadela.
Deus do céu! Vovó tinha acabado de piscar e sugerir que Joe era seu... ele nem conseguia concluir o pensamento. Horrorizado, viu os olhos de Aileen se arregalarem. Abriu a boca para responder, mas a avó lhe deu um tapa na bunda que o empurrou na direção contrária.
Seu carma estava finalmente acertando as contas. E na forma de uma mulher de 86 anos com batom nos dentes.
Mas que merda!

*****

Eu to muito animada com essa fic, então resolvi postar o prólogo e o primeiro capítulo de uma vez. Espero que gostem.. O que acharam da vovó?
Eu amo ela e, só pra constar, ela vai aprontar muito, asklmaoks
Beijos, amo vcs 
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