30.1.15

Capítulo Cinco




Quarta-feira, 29 de agosto de 2012
6h15

Corro há quase três anos. Não lembro por que comecei nem por que passei a gostar tanto a ponto de me tornar tão disciplinada. Acho que tem muito a ver com o fato de eu ser tão frustrantemente protegida. Tento ficar otimista quanto a isso, mas é difícil ver as interações e os relacionamentos que os outros alunos têm no colégio, mas eu não. Não ter acesso à internet enquanto estivesse no ensino médio não seria algo tão relevante alguns anos atrás, mas agora é praticamente um suicídio social. Não que eu me importe com o que as pessoas pensam.
Não vou negar, tive uma vontade imensa de investigar Jonas na internet. Antes, quando queria descobrir mais sobre alguma pessoa, eu e Miley usávamos a conexão da casa dela. Mas agora Miley está num voo transatlântico, então não posso pedir a ela. Em vez disso, fico sentada na cama, pensando no assunto. Será que ele é mesmo tão mau quanto sua reputação? Será que provoca em outras garotas o mesmo efeito que tem em mim? Quem serão os pais dele, será que tem irmãos, será que está namorando alguém? Por que quer ficar com raiva de mim o tempo inteiro se a gente acabou de se conhecer? Ele é sempre tão charmoso quando não está tão ocupado com a própria raiva? Odeio que ele seja sempre uma coisa ou outra, sem ter um meio-termo. Seria tão bom ver um lado seu mais calmo e relaxado. Será que ele tem esse meio-termo? Fico me perguntando essas coisas... porque é tudo o que posso fazer. Fazer essas perguntas para mim mesma em silêncio a respeito do caso perdido que de alguma maneira se entocou bem no meio dos meus pensamentos e que não quer sair de maneira alguma.
Saio do meu transe e termino de calçar o tênis de corrida. Pelo menos, nosso desentendimento da véspera, no corredor, não foi resolvido. Por causa daquilo, ele não vai correr comigo hoje, o que me deixa bastante aliviada. Preciso do meu tempo sozinha mais que nunca. Não sei por qual motivo, mas vou ficar o tempo inteiro imaginando coisas.
Sobre ele.
Abro a janela do quarto e saio. Está mais escuro que o normal para essa hora da manhã. Olho para cima e vejo que o céu está nublado, refletindo com perfeição meu humor. Observo a direção das nuvens e olho para o céu à esquerda, curiosa para ver se tenho tempo suficiente para correr antes da chuva torrencial começar.
— Você sempre sai pela janela ou estava apenas tentando me evitar?
Eu me viro ao ouvir sua voz. Ele está na beirada da calçada, de bermuda e tênis de corrida. E dessa vez sem camisa.
Droga.
— Se estivesse tentando evitá-lo, teria simplesmente ficado na cama. — Ando até ele com confiança, esperando disfarçar que vê-lo fez com que meu corpo inteiro entrasse em curto-circuito. Uma pequena parte de mim está desapontada por ele ter aparecido hoje, mas a maior parte está ridiculamente, pateticamente feliz. Passo por ele e me abaixo na calçada para me alongar. Abro as pernas e me inclino para a frente, me apoiando no tênis e enterrando a cabeça no joelho — em parte para alongar o músculo, mas também para evitar olhar para ele.
— Não sabia se você viria. — Ele se abaixa e fica na minha frente na calçada.
Eu me levanto e olho para ele.
— Por que eu não viria? Não sou eu a problemática. Além disso, nenhum de nós é dono da rua. — Eu praticamente vocifero com ele. Sem nem saber o motivo.
Mais uma vez ele faz aquilo de ficar me encarando e pensando, o olhar intenso me deixando sem reação. Repete tanto isso que quase fico com vontade de batizar esse hábito. É como se ele estivesse me prendendo com os olhos enquanto pensa em silêncio, sem trair nenhuma indicação de propósito na expressão. Nunca conheci ninguém que pensasse tanto nas próprias falas. A maneira como ele fica refletindo enquanto prepara sua resposta — parece até que as palavras são limitadas e que ele só quer usar as que forem de extrema necessidade.
Paro de me alongar e me viro para ele, sem vontade de ceder nessa disputa visual. Não vou deixar que faça seus truquezinhos mentais de Jedi comigo, não importa o quanto queira ser capaz de fazer algo assim com ele. Jonas é completamente incompreensível e ainda mais imprevisível. Isso me deixa furiosa.
Ele alonga as pernas na minha frente.
— Me dê as mãos. Também preciso me alongar.
Ele está sentado com as mãos estendidas na minha frente como se fôssemos brincar de adoleta. Se alguém passar de carro, dá para imaginar os boatos surgindo. Só de pensar, começo a rir. Ponho as mãos nas suas, e ele me puxa para a frente, em sua direção, por vários segundos. Quando ele relaxa, também o puxo para a frente e ele se alonga, mas não olha para baixo. Em vez disso, continua com o olhar fixo e debilitante nos meus olhos.
— Só para constar — diz ele. — Ontem não fui eu o problemático.
Eu o puxo com força redobrada, mais por malícia que por desejo de ajudá-lo a se alongar.
— Está insinuando que eu sou a problemática?
— E não é?
— Esclareça — digo. — Não gosto de coisas vagas.
Ele ri, mas é uma risada irritante.
— Demi, se tem uma coisa que deve saber sobre mim é que não sou vago. Já disse que vou ser sempre sincero com você, e, para mim, ser vago é a mesma coisa que ser desonesto. — Ele puxa minha mão mais para a frente e se inclina para trás.
— Acabou de me dar uma resposta bastante vaga — saliento.
— Você não me perguntou nada. Já disse que se quiser saber alguma coisa, é só me perguntar. Parece que você acha que me conhece, quando na verdade nunca me perguntou nada.
— Eu não conheço você.
Ele ri de novo, balança a cabeça e solta minhas mãos.
— Deixe para lá. — Ele se levanta e começa a se afastar.
— Espere. — Eu me levanto do concreto e vou atrás dele. Se alguém aqui tem o direito de estar com raiva, esse alguém sou eu. — O que foi que acabei de dizer? Que não conheço você. Por que está todo irritado comigo de novo?
Ele para de andar, vira-se e dá alguns passos em minha direção.
— Achei que depois de passar um tempo juntos nos últimos dias, você teria uma reação um pouco diferente no colégio. Já dei várias oportunidades para me perguntar o que quiser, mas, por algum motivo, prefere acreditar no que ouve por aí, apesar de não ter ouvido nada da minha boca. E, vindo de alguém que também é vítima de vários boatos, imaginei que não seria tão rápida em julgar.
Vítima de vários boatos? Se ele acha que vai ganhar pontos comigo por termos algo em comum, errou feio.
— Então é isso? Você achou que a periguete novata se identificaria com o babaca que bate em gays?
Ele solta um gemido e passa a mão pelo cabelo, frustrado.
— Não faça isso, Demi.
— Não fazer o quê? Chamar você de babaca que bate em gays? Está bem. Vamos colocar em prática essa sua sinceridade. Você deu ou não deu uma surra tão grande num aluno no ano passado e, por isso, acabou sendo preso?
Ele põe as mãos no quadril e balança a cabeça. Em seguida olha para mim com o que parece ser uma expressão de desapontamento.
— Quando eu disse não faça isso, não estava me referindo a me insultar. Estava me referindo a insultar a si mesma. — Ele dá um passo à frente, diminuindo a distância entre nós. — E sim. Bati tanto que por pouco ele não morreu, e, se aquele canalha aparecesse na minha frente agora, eu faria tudo de novo.
Seus olhos estão tomados pela raiva, e fico com medo demais para continuar falando sobre o assunto. Ele pode até ter dito que seria sincero... mas suas respostas me apavoram mais que a ideia de fazer mais perguntas. Dou um passo para trás, e ele faz o mesmo. Nós dois ficamos em silêncio, e me pergunto como chegamos a esse ponto.
— Não quero correr com você hoje — digo.
— Também não estou muito a fim de correr com você.
Com isso, nos viramos em direções opostas. Ele segue para sua casa, eu, em direção à minha janela. Não tenho nem vontade de correr sozinha.
Entro pela janela assim que a chuva começa a cair, e, por um instante, fico com pena por ele ter de correr até sua casa. Mas só por um instante, pois o carma não deixa nada passar e, com certeza, agora está retaliando Jonas. Fecho a janela e vou até a cama. Meu coração está tão disparado que parece que acabei de correr os 5 quilômetros. Só que, em vez disso, está disparando porque estou incrivelmente furiosa.
Conheci esse garoto faz apenas uns dias, mas jamais discuti tanto com alguém na minha vida. Se eu somasse todas as discussões que Miley e eu tivemos nos últimos quatro anos, o resultado não chegaria nem perto das últimas 48 horas com Jonas. Não sei nem por que ele se importa. Acho que depois de hoje é provável que não se importe mais.
Pego o envelope na minha mesinha de cabeceira e o abro. Tiro a carta de Miley, me encosto no travesseiro e a leio, querendo fugir do caos em minha cabeça.

Demi,
Espero que quando estiver lendo isso (pois sei que você não vai ler na mesma hora), eu já esteja loucamente apaixonada pelo meu namorado italiano gato e não esteja mais pensando em você nem por um segundo.
Mas sei que não é verdade, pois vou pensar em você o tempo inteiro.
Vou pensar em todas as noites que ficamos acordadas com nossos sorvetes, nossos filmes e nossos garotos. Mais que tudo, vou ficar pensando em você e em todas as razões pelas quais a amo.
Só para citar algumas: amo o fato de você ser péssima com despedidas, sentimentos e emoções, pois também sou assim. Amo como sempre pega a parte de morango e de baunilha do sorvete por saber o quanto amo a parte de chocolate, apesar de você também amar. Amo o fato de não ser estranha e desajeitada apesar de estar tão isolada da sociedade a ponto de fazer os Amish parecerem fashion.
Mais que tudo, amo o fato de você não me julgar. Amo que, nos últimos quatro anos, jamais questionou minhas escolhas (por mais que tenham sido ruins) nem os garotos com quem fiquei nem o fato de eu não acreditar em namoro. Eu poderia dizer que é fácil você não me julgar pois também é uma piranha safada. Mas nós duas sabemos que isso é mentira. Então obrigada por ser uma amiga livre de julgamentos. Obrigada por nunca ser condescendente nem me tratar como se você fosse melhor que eu (apesar de nós duas sabermos que você é). Por mais que eu consiga rir das coisas que as pessoas falam sobre nós pelas costas, fico arrasada por dizerem essas coisas sobre você também. E por isso peço desculpas. Mas nem tanto, pois sei que se você tivesse de escolher entre ser minha melhor amiga piranha ou a santinha, você daria para todos os caras do mundo. Pois você me ama muito. E eu permitiria isso, porque também a amo tanto assim.
E só mais uma coisa que amo em você antes de eu calar a boca, pois estou a apenas 2 metros de distância enquanto escrevo esta carta e está sendo bem difícil não sair pela minha janela e ir apertar você.
Amo sua indiferença. E o fato de você não estar nem aí para o que as pessoas pensam. Amo como você está focada no seu futuro e todo o resto que se dane. Amo o fato de que, quando contei que ia para a Itália depois de convencê-la a se matricular no meu colégio, você simplesmente sorriu e deu de ombros quando isso teria destruído a amizade de quase todas as melhores amigas. Deixei você na mão para ir atrás do meu sonho, e você não deixou que isso a chateasse. Nem pegou no meu pé por causa disso.
Amo que (última coisa, prometo) quando vimos Forças do Destino e Sandra Bullock foi embora no final e eu fiquei gritando com a televisão por causa desse fim horroroso, você simplesmente deu de ombros e disse: “É realista, Miley. Você não pode ficar com raiva de um final realista. Alguns são horrorosos mesmo. São os finais felizes superfalsos que deviam irritar você.”
Nunca vou me esquecer daquilo, pois você tinha razão. E sei que não estava tentando me ensinar uma lição, mas foi isso o que acabou acontecendo. Nem tudo vai dar certo no meu caminho e nem todo mundo ganha um final feliz. A vida é realista, e, às vezes, as coisas ficam feias e só nos resta aprender a lidar com elas. Vou aceitar isso com uma dose da sua indiferença e seguir em frente.
Então. Enfim. Já chega. Só queria dizer que vou sentir sua falta e avisar que é melhor esse seu novo melhor amigo do mundo inteiro cair fora quando eu voltar daqui a seis meses. Espero que perceba o quanto você é incrível, mas, caso não note, vou mandar todos os dias uma mensagem para que se lembre. Prepare-se para ser bombardeada nos próximos seis meses com mensagens irritantes e sem fim, contendo apenas elogios a Demi.
Amo você,
Mi

Dobro a carta e sorrio, mas não choro. Ela não esperaria que eu chorasse com a carta, não importa o quanto tenha me deixado com vontade de fazer isso. Estendo o braço até a mesinha de cabeceira e pego na gaveta o celular que ela me deu. Tenho duas mensagens que não vi.

Já disse o quanto você é incrível alguma vez recentemente? Saudades.
É o segundo dia, é melhor me responder. Preciso contar sobre Lorenzo. Além disso, você é inteligente de uma maneira repugnante.

Sorrio e respondo a mensagem. Preciso de umas cinco tentativas para descobrir como fazer isso. Tenho quase 18 anos e é a primeira mensagem que envio na vida? Isso precisa entrar para o Guinness.

Posso me acostumar com esses elogios diários. Não se esqueça de me lembrar o quanto sou bonita, o quanto meu gosto musical é impecável, e que sou a corredora mais rápida do mundo. (Só algumas ideias para começar). Saudades também. E não vejo a hora de saber mais sobre Lorenzo, sua piranha.

Sexta-feira, 31 de agosto de 2012
11h20

Os próximos dias no colégio são parecidos com os dois primeiros. Cheios de drama. Meu armário parece ter se tornado um centro de post-its e bilhetes grosseiros, apesar de eu jamais ver nada sendo colocado na porta ou dentro dele. Não consigo entender o que as pessoas ganham com isso se nem assumem a autoria. Como o bilhete que estava colado no meu armário hoje de manhã. Tudo o que dizia era: “puta”.
Sério? Cadê a criatividade? Não dava para justificar isso com uma história interessante? Talvez alguns detalhes da minha indiscrição? Se vou ler essa merda todo dia, o mínimo que podem fazer é tornar a situação mais interessante. Se eu fosse me rebaixar ao nível de deixar um bilhete injustificado no armário de alguém, pelo menos faria a gentileza de entreter quem vai lê-lo. Escreveria algo interessante como: “Peguei você na cama com meu namorado ontem à noite. Não curti você ter passado óleo de massagem nos meus pepinos. Sua puta.”
Acho graça, e é estranho rir em voz alta de meus próprios pensamentos. Olho ao redor e vejo que não tem mais ninguém no corredor. Em vez de arrancar os post-its do armário, que provavelmente é o que eu devia fazer, pego minha caneta e os torno um pouco mais criativos. De nada, transeunte.
Nick põe a bandeja na frente da minha. Agora cada um buscava sua própria bandeja, pois ele parece achar que só quero comer salada. Sorri para mim como se soubesse que vou querer saber do segredo que ele está guardando. Mas se for mais um boato, dispenso.
— Como foram os testes para entrar na equipe de atletismo ontem? — pergunta ele.
Dou de ombros.
— Não fui.
— Pois é, eu sei.
— Então por que perguntou?
Ele ri.
— Porque primeiro gosto de esclarecer as coisas com você antes de acreditar nelas. Por que não foi? — Dou de ombros mais uma vez. — E que história é essa de ficar dando de ombros? É tique nervoso?
Repito o dar de ombros.
— Só não estou a fim de fazer parte de uma equipe com as pessoas daqui. Perdi o interesse.
Ele franze a testa.
— Para começar, atletismo é um dos esportes mais individuais de todos. Segundo, achei que você tinha dito que estava aqui por causa das atividades extracurriculares.
— Não sei por que estou aqui — digo. — Talvez estivesse sentindo necessidade de testemunhar uma boa dose do pior da natureza humana antes de entrar no mundo real. Assim o choque não vai ser tão grande.
Ele aponta para um aipo e ergue a sobrancelha.
— É verdade. Uma introdução gradual aos perigos da sociedade vai ajudar a amortecer o choque. Não podemos soltá-la sozinha no meio do mato depois que passou a vida inteira sendo mimada num zoológico.
— Bela analogia.
Ele pisca para mim e morde o aipo.
— Por falar em analogias, o que é aquilo no seu armário? Ele estava coberto de analogias e metáforas sexuais.
Eu rio.
— Gostou? Demorei um tempinho, mas estava me sentindo criativa.
Ele concorda com a cabeça.
— Gostei especialmente do que dizia “Você é tão puta que deu para Nick, o mórmon.” Balanço a cabeça.
— Esse daí não foi de minha autoria. Foi verdadeiro. Mas eles ficaram mais divertidos, não é? Agora que estão com mais sacanagem?
— Bem, eles eram divertidos. Não estão mais lá. Vi Jonas rasgando-os ainda agora.
Olho imediatamente para ele, que está sorrindo com certa malícia mais uma vez. Acho que era esse o segredo que não estava conseguindo segurar.
— Que estranho.
Estou curiosa para saber por que Jonas se daria o trabalho de fazer uma coisa dessas. Nós nem corremos juntos desde que nos falamos pela última vez. Na verdade, nem interagimos mais. Agora ele se senta do outro lado da sala na primeira aula, e eu não o vejo durante o resto do dia, só no almoço. E, mesmo assim, ele se senta do outro lado do refeitório, com os amigos. Pensei que depois do nosso impasse estávamos nos evitando e fim de história, mas pelo jeito estava errada.
— Posso perguntar uma coisa? — diz Nick.
Dou de ombros novamente, mais para irritá-lo.
— Os boatos sobre ele são verdadeiros? Sobre ser esquentado? E sobre a irmã?
Tento não parecer surpresa com o comentário, mas é a primeira vez que ouço falar de uma irmã.
— Não faço ideia. Mas passei tempo suficiente com ele para saber que me assusta o bastante e, por isso, não quero mais passar tempo com ele.
Estou louca para perguntar sobre o comentário da irmã, mas não tenho voz ativa quando minha teimosia fala mais alto. Por alguma razão, investigar a vida de Joseph Jonas é um desses momentos.
— Oi — diz uma voz atrás de mim.
Imediatamente sei que não é Jonas, pois a voz não surtiu efeito algum em mim. Quando me viro, Zac põe a perna ao meu lado no banco e se senta. — Tem planos para depois da escola?
Mergulho o aipo no molho ranch e dou uma mordida.
— Provavelmente.
Zac balança a cabeça.
— Não gostei dessa resposta. Encontro você no seu carro depois da última aula.
Ele se levanta e vai embora antes que eu possa contestar. Nick dá um sorriso sarcástico. Eu só dou de ombros.
Nem imagino o que Zac quer falar comigo, mas ele precisa de uma lobotomia se pensa que vai passar na minha casa amanhã à noite. Estou me sentindo mais que pronta a abdicar dos garotos pelo resto do ano. Especialmente se não tenho mais Miley para tomar sorvete comigo depois que vão embora. O sorvete era a única parte boa de ficar com eles.
Pelo menos ele cumpre o que disse e está esperando no meu carro, encostado na porta do motorista, quando chego no estacionamento.
— Oi, princesa — diz ele.
Não sei se é o tom de voz ou o fato de ter acabado de me dar um apelido, mas suas palavras me fazem estremecer. Vou até lá e me apoio no carro ao seu lado.
— Nunca mais me chame de princesa.
Ele ri e desliza o corpo para minha frente, segurando minha cintura.
— Tudo bem. Que tal linda?
— Que tal Demi mesmo?
— Por que sempre está com raiva?
Ele estende as mãos para meu rosto, toca minhas bochechas e me beija. Tristemente, eu deixo ele fazer isso. Em boa parte porque acho que merece, após me aguentar por um mês inteiro. No entanto, não tem direito a tantos favores assim, então afasto meu rosto apenas alguns segundos depois.
— O que você quer?
Ele põe os braços ao redor da minha cintura e me puxa para perto.
— Você. — Ele começa a beijar meu pescoço, então o empurro, e ele se afasta. — O que foi?
— A ficha ainda não caiu? Eu disse que não vou dormir com você, Zac. Não estou tentando fazer joguinhos nem querendo que fique correndo atrás de mim o tempo inteiro, como outras garotas doentias e esquisitas fazem. Você quer mais, e eu não, então acho que precisamos aceitar o impasse e seguir em frente.
Ele fica me encarando, suspira e me puxa para perto, me abraçando.
— Não preciso de nada mais, Demi. Está bom desse jeito mesmo. Não vou insistir de novo. É que gosto de ir para sua casa e gostaria de passar lá amanhã à noite. — Ele lança para mim aquele sorriso arranca-calcinha. — Agora pare de ficar com raiva de mim e venha aqui. — Ele puxa meu rosto para perto e me beija novamente.
Por mais irritada e furiosa que esteja, não deixo de sentir um alívio assim que seus lábios encontram os meus; é a irritação diminuindo por causa do entorpecimento que toma conta de mim. Só por esse motivo, deixo que ele continue me beijando. Ele me aperta contra o carro, passa a mão no meu cabelo e depois beija meu queixo e meu pescoço. Apoio a cabeça no carro e ergo o punho atrás dele para ver a hora no meu relógio. Dianna vai viajar a trabalho, então preciso ir ao mercado comprar doces para todo o fim de semana. Não sei por quanto tempo ele vai continuar me apalpando, mas sorvete está começando a parecer algo tentador. Reviro os olhos e abaixo o braço. Na mesma hora, meu batimento cardíaco triplica e meu estômago se revira e sinto todas as coisas que uma garota deve sentir quando os lábios de um gato a estão beijando. Mas não estou reagindo ao cara bonito cujos lábios estão me beijando. E sim ao cara bonito que está me fulminando com o olhar do outro lado do estacionamento.
Jonas está parado ao lado do carro dele, com o cotovelo apoiado na porta, nos observando. Imediatamente, empurro Zac para longe de mim e me viro para entrar no carro.
— Então está combinado amanhã à noite? — pergunta ele.
Entro no carro, ligando o motor, e depois olho para ele.
— Não. A gente já era.
Fecho a porta e saio da vaga de ré, sem saber se estou furiosa, envergonhada ou apaixonada. Como ele é capaz de fazer isso? Como é que me faz sentir essas coisas lá do outro lado do estacionamento?
Acho que estou precisando de uma intervenção.

*****

Oi oi, gente, como vocês estão?
Meninas, nunca se preocupem com o fato de um dia eu desistir do blog com uma fic em andamento, ok? Porque acho uma das coisas mais chatas que existem, o leitor "perde tempo" lendo capítulo por capítulo, comentando, atualizando, fora toda a curiosidade, pra no final a dona do blog interromper tudo? Já aconteceu isso com fics que eu realmente gostava, e eu sei como dá raiva, então, se um dia eu parar de postar aqui, será com todas as histórias, ok?
But, não se preocupem, porque eu amo vocês e tudo isso aqui, e não pretendo abandonar tão cedo
Respostas aqui.
É isso, love u, bjs

28.1.15

Capítulo Quatro


Eu te amo com toda minha alma, anjo


Terça-feira, 28 de agosto de 2012
6h15

O alarme soa, e imediatamente penso em deixar para lá a corrida de hoje, até que lembro quem está me esperando lá fora. Eu me visto com a maior rapidez desde que aprendi a me vestir sozinha e vou até a janela. Há um cartão grudado na parte de dentro do vidro com a palavra “vagabunda” escrita com a letra de Miley. Sorrio, tiro o cartão da janela e o jogo na minha cama antes de sair de casa.
Ele está sentado no meio-fio, alongando as pernas. Está de costas para mim, o que é bom. Caso contrário, teria me visto franzir a testa ao perceber que estava de camisa. Ao escutar meus passos, ele se vira na minha direção.
— Oi, você. — Ele sorri e se levanta. Ao fazer isso, percebo que sua camisa já está encharcada. Ele veio correndo até aqui. Correu mais de 3 quilômetros até aqui, está prestes a correr mais 5 comigo e depois mais 3 para voltar para casa. Não consigo entender por que está fazendo tudo isso. Ou por que estou permitindo. — Precisa se alongar primeiro? — pergunta ele.
— Já me alonguei.
Ele estende o braço e toca minha bochecha com o polegar.
— Não está tão ruim — diz ele. — Está sentindo dor?
Nego com a cabeça. Ele realmente espera que eu verbalize uma resposta enquanto seus dedos encostam em meu rosto? É muito difícil falar e prender a respiração ao mesmo tempo.
Ele afasta a mão e sorri.
— Ótimo. Está pronta?
Solto o ar.
— Estou.
E então nós corremos. Corremos lado a lado por um tempo até o caminho se estreitar e ele passar a correr atrás de mim, o que me deixa incrivelmente constrangida. Costumo me sentir bem solta quando corro, mas dessa vez estou atenta a todos os detalhes, como o cabelo, o comprimento do short, cada gota de suor que escorre pelas costas. Fico aliviada quando o caminho fica mais largo e ele volta para meu lado.
— Você devia mesmo tentar entrar para a equipe de atletismo. — A voz dele está normal e não parece de jeito algum que ele já correu 6,5 quilômetros naquela manhã. — Tem mais resistência que a maioria do pessoal da equipe do ano passado.
— Não sei se quero — digo, ofegante e nem um pouco atraente. — Não conheço ninguém no colégio. Pensei em tentar, mas até agora a maioria das pessoas foi meio... malvada. Não quero ficar sujeita a eles ainda mais tempo por causa de uma equipe.
— Você só teve um dia de aula na escola. Espere mais um pouco. Depois de passar a vida inteira estudando dentro de casa, não dá para esperar que chegue no colégio e faça vários amigos no primeiro dia.
Paro imediatamente. Ele dá mais alguns passos antes de perceber que não estou mais ao seu lado. Ao se virar e me ver parada na rua, corre para perto de mim e agarra meus ombros.
— Você está bem? Ficou tonta?
Balanço a cabeça e afasto as mãos dele dos ombros.
— Estou bem — digo, com uma irritação bem audível na voz.
Ele inclina a cabeça.
— Eu disse algo de errado?
Começo a andar na direção da minha casa, então ele me acompanha.
— Um pouco — respondo, dando uma olhada nele. — Estava meio que brincando com a história de estar me perseguindo ontem, mas você admitiu que me procurou no Facebook logo depois de me conhecer. E depois insistiu em correr comigo, apesar de não ser seu caminho. E agora descubro que de alguma maneira você sabe há quanto tempo estudo na escola? E que eu estudava em casa antes? Não vou mentir, é um pouco assustador.
Fico esperando uma explicação, mas tudo o que ele faz é estreitar os olhos e me observar. Ainda estamos andando para a frente, mas ele fica me olhando em silêncio até dobrarmos a próxima esquina. Quando finalmente fala alguma coisa, as palavras são antecedidas por um longo suspiro.
— Perguntei por aí — diz ele, por fim. — Moro aqui desde os 10 anos, então tenho muitos amigos. Estava curioso sobre você.
Fico olhando-o por mais alguns passos, em seguida desvio o olhar para a calçada. De repente não sou mais capaz de olhar para ele, pensando no que mais esses “amigos” disseram sobre mim. Sei que os boatos têm se espalhado desde que Miley e eu nos tornamos próximas, mas é a primeira vez que me senti um pouco envergonhada ou na defensiva por causa disso. O fato de ele estar gastando tanta energia para correr comigo só pode significar uma coisa. Ficou sabendo dos boatos e está torcendo para que sejam verdade.
Ele percebe que estou constrangida, então agarra meu cotovelo e me faz parar.
— Demi.
Nós ficamos de frente um para o outro, mas meus olhos estão grudados no concreto. Hoje não estou só de top de ginástica, mas cruzo os braços por cima da camisa de qualquer jeito e me abraço. Não tem nada à mostra para ser coberto, mas por alguma razão estou me sentindo totalmente exposta.
— Acho que ontem começamos as coisas com o pé esquerdo no mercado — diz ele. — E aquele papo de perseguir você, juro que foi brincadeira. Não quero que fique constrangida perto de mim. Se sentiria melhor se soubesse mais sobre mim? Pergunte alguma coisa que eu respondo. Qualquer coisa.
Espero mesmo que ele esteja sendo sincero porque já consigo perceber que não é o tipo de cara pelo qual uma garota tem uma simples quedinha. É o tipo de cara pelo qual a gente se apaixona loucamente, e isso me deixa apavorada. Não quero de jeito algum me apaixonar loucamente por alguém, muito menos por alguém que só está perdendo seu tempo porque acha que sou fácil. Também não quero me apaixonar por alguém que já se considera um caso perdido. Porém estou curiosa. Tão curiosa.
— Se eu fizer uma pergunta, você vai ser sincero?
Ele inclina a cabeça para mim.
— Isso serei sempre.
A maneira como ele abaixa a voz ao falar faz minha cabeça rodopiar, e, por um segundo, fico com medo de acabar desmaiando outra vez se ele continuar falando assim. Por sorte, ele dá um passo para trás e fica esperando minha pergunta. Quero perguntar sobre seu passado. Quero saber por que foi preso, por que fez tudo aquilo e por que Miley não confia nele. Mais uma vez, no entanto, ainda não sei se quero saber a verdade.
— Por que desistiu do colégio?
Jonas suspira como se essa fosse uma das perguntas que estava querendo evitar. Ele começa a dar alguns passos para a frente, e, dessa vez, sou eu que vou atrás dele.
— Tecnicamente, ainda não desisti.
— Bem, é óbvio que faz mais de um ano você não aparece. Para mim isso é desistir.
Ele se vira e parece estar se sentindo dividido, como se quisesse me contar alguma coisa. Abre a boca, mas a fecha em seguida, após hesitar. Odeio não conseguir interpretá-lo. É fácil interpretar a maioria das pessoas. Elas são simples. Jonas é todo confuso e complicado.
— Eu me mudei de volta para cá só faz alguns dias — diz ele. — O ano passado foi péssimo para minha mãe e eu, então fui morar por um tempo com meu pai em Austin. Estava estudando por lá, mas senti que era hora de voltar para casa. Então aqui estou.
O fato de ele não ter mencionado o tempo na prisão me faz questionar a capacidade dele de ser sincero. Entendo que esse provavelmente não é um assunto do qual queira falar, mas ele não devia afirmar que vai ser sempre sincero quando obviamente não é isso o que está fazendo.
— Nada disso explica por que você preferiu desistir em vez de pedir transferência para cá.
Ele dá de ombros.
— Não sei. Para falar a verdade, ainda estou decidindo o que quero fazer. Este ano tem sido foda. Sem falar que eu odeio a escola daqui. Cansei de todas as palhaçadas e às vezes penso que seria mais fácil fazer outra coisa.
Paro de andar e me viro para ele.
— Que desculpa de merda.
Ele ergue a sobrancelha para mim.
— É uma desculpa de merda eu odiar o colégio?
— Não. É uma desculpa de merda você deixar um ano ruim determinar o resto de sua vida. Faltam nove meses para a formatura e vai desistir? É só... é burrice.
Ele ri.
— Bem, se está explicando com tanta eloquência.
— Pode rir o quanto quiser. Sair do colégio é simplesmente desistir. Está dando razão a quem quer que tenha duvidado de você. — Olho para baixo e reparo na tatuagem em seu braço. — Vai desistir e mostrar ao mundo que é mesmo um caso perdido? Que maneira de enfrentá-los.
Ele acompanha meu olhar até a tatuagem e a encara por um instante, cerrando os dentes. Não queria ter mudado de assunto, mas não se importar com os estudos é um assunto delicado para mim. Culpo Dianna pelos anos enfiando em minha cabeça que sou a única responsável pelo meu futuro.
Jonas desvia o olhar da tatuagem que estamos encarando, olha para cima e indica minha casa com a cabeça.
— Chegamos — diz ele, sem expressão alguma. Ele se vira sem nem sequer sorrir ou acenar.
Fico parada na calçada, observando-o desaparecer ao dobrar a esquina sem olhar para trás nenhuma vez.
E eu achando que hoje conversaria com apenas uma das personalidades dele. Não mesmo.

Terça-feira, 28 de agosto de 2012
07h55

No primeiro horário, entro na sala de aula e Nick está sentado mais no fundo com todo seu glamour rosa-choque. Realmente não entendo como não pude perceber esses sapatos rosa-choque e o garoto dentro deles antes do almoço de ontem.
— Oi, gatão — digo ao me sentar ao lado dele. Tiro o copo de café de suas mãos e tomo um gole. Ele aceita, pois ainda não me conhece tão bem para reclamar. Ou talvez esteja permitindo por saber as consequências de interromper uma viciada em cafeína.
— Ontem à noite descobri muita coisa a seu respeito — diz ele. — Pena que sua mãe não libera seu acesso à internet. É um lugar incrível para você descobrir coisas sobre si mesma que nem você sabia.
Eu rio.
— E será que quero saber? — Inclino a cabeça para trás, termino o café e devolvo o copo em seguida. Ele olha para o copo vazio e o deixa em cima da minha carteira.
— Bem — diz ele. — De acordo com minhas buscas no Facebook, alguém chamado Liam Hemsworth foi para sua casa na sexta à noite, semeando o medo de uma possível gravidez. No sábado, você transou com alguém chamado Zac e depois o expulsou. Ontem... — Ele tamborila os dedos no queixo. — Ontem você foi vista correndo com um cara chamado Joseph Jonas depois da aula. O que me preocupa um pouco, pois de acordo com os boatos... ele não é muito fã de mórmons.
Às vezes fico contente por não ter acesso à internet como as outras pessoas.
— Vejamos — digo, pensando na lista de boatos. — Nem sei quem é Liam Hemsworth. No sábado, Zac foi, sim, a minha casa, mas aquele pinguço mal me tocou antes que eu o expulsasse. E, sim, ontem corri com um cara chamado Jonas, mas não faço ideia de quem ele é. Foi pura coincidência estarmos correndo na mesma hora, e ele não mora muito longe de mim, então...
Na mesma hora, me sinto culpada por ter minimizado a importância da corrida com Jonas. É que ainda não entendi muito bem quem ele é, e não sei se já estou pronta para que alguém se infiltre na minha aliança de 24 horas com Nick.
— Se isso serve de consolo, descobri por uma tal de Shayna que sou herdeiro de uma enorme fortuna — diz ele.
Acho graça.
— Ótimo. Assim você não vai ter problema em trazer café para mim todos os dias.
A porta da sala de aula se abre, e nós dois erguemos o olhar no instante em que Jonas entra vestindo camisa branca casual e calça jeans escura, com o cabelo recém-lavado depois de nossa corrida. Assim que o vejo, o vírus estomacal/onda de calor/frio na minha barriga volta.
— Merda — murmuro.
Jonas vai até a escrivaninha do Sr. Mulligan, deixa ali um formulário e segue para o fundo da sala, mexendo no celular o tempo inteiro. Ele se senta na carteira bem na frente de Nick e nem nota minha presença. Depois, diminui o volume do celular e o guarda no bolso.
Estou chocada demais para falar com ele. Será que de alguma maneira consegui fazer com que mudasse de ideia sobre se matricular? Será que estou feliz por talvez ter feito ele mudar de ideia? Porque eu meio que só estou sentindo arrependimento.
O Sr. Mulligan entra na sala, deixa suas coisas na escrivaninha, segue para o quadro e escreve seu nome e a data. Não sei se ele realmente acha que já esquecemos quem é desde ontem, ou se simplesmente quer nos lembrar que nos considera burros.
— Joe — diz ele, ainda de frente para o quadro. Ele se vira e fixa o olhar em Jonas. — Bem-vindo de volta, com um dia de atraso. Presumo que não vai causar confusão esse semestre?
Fico boquiaberta com o comentário condescendente tão imediato. Se é esse tipo de merda que Jonas precisa aturar quando está aqui, não é de surpreender que ele não quisesse voltar. Pelo menos são só os alunos que pegam no meu pé. Professores jamais deveriam ser condescendentes, com aluno algum. Essa devia ser a primeira regra no manual dos professores. A segunda devia ser que os professores não têm permissão para escrever o nome no quadro depois da terceira série.
Jonas muda de posição na cadeira e responde o comentário do Sr. Mulligan com o mesmo tom de provocação.
— Presumo que não vai dizer nada que me faça causar confusão esse semestre, Sr. Mulligan?
Tudo bem, obviamente o “não estou nem aí para essa merda” é uma via de mão dupla. Depois de convencê-lo a voltar ao colégio, talvez minha próxima lição deva ser ensinar a Jonas um salutar respeito por autoridades.
O Sr. Mulligan inclina o queixo para trás e fulmina Jonas com o olhar por cima da armação dos óculos.
— Joe. Por que não vem para a frente da sala e se apresenta aos seus colegas? Com certeza há novos rostos desde sua saída no ano passado.
Jonas não reclama, o que com certeza era o que o Sr. Mulligan esperava que fizesse. Em vez disso, ele praticamente salta da cadeira e vai depressa até a frente da sala. O movimento brusco e cheio de energia faz o Sr. Mulligan dar um rápido passo para trás. Jonas vira-se, ficando de frente para a sala, sem um pingo de insegurança ou hesitação.
— Com alegria — diz Jonas, lançando um olhar para o Sr. Mulligan. — Meu nome é Joseph Jonas. As pessoas me chamam de Jonas. — Ele desvia o olhar do Sr. Mulligan para a sala. — Estudo aqui desde o primeiro ano, com exceção de um semestre e meio de período sabático. E, de acordo com o Sr. Mulligan, gosto de causar confusão, então essa matéria vai ser bem divertida.
Vários alunos riem do comentário, mas não entendo qual foi a graça. Já estava duvidando dele por causa de tudo que ouvi, e agora ele está mostrando quem realmente é pela maneira como está agindo. Jonas abre a boca para continuar sua apresentação, mas um sorriso surge em seu rosto assim que me vê no fundo da sala. Ele dá uma piscadela para mim, e imediatamente tenho vontade de me esconder debaixo da carteira. Dou um rápido sorriso tenso e fixo o olhar na minha mesa assim que os outros alunos começam a se virar para ver para quem ele está olhando.
Uma hora e meia atrás, ele se afastou de mim todo mal-humorado. Agora está sorrindo, como se tivesse acabado de ver sua melhor amiga pela primeira vez em anos.
Pois é. Ele tem problemas.
Nick inclina-se por cima da carteira.
— O que diabos foi isso? — sussurra ele.
— Conto no almoço — digo.
— É essa sabedoria que quer compartilhar conosco hoje? — pergunta o Sr. Mulligan a Jonas.
Jonas concorda com a cabeça e volta para sua carteira, sem desviar o olhar do meu nem por um segundo. Ele se senta e vira o pescoço, ficando de frente para mim. O Sr. Mulligan começa a aula, e todo mundo volta a prestar atenção na frente da sala. Todo mundo menos Jonas. Baixo o olhar para meu livro e o abro no capítulo em que estamos, esperando que ele faça o mesmo. Quando ergo novamente o olhar, vejo que ainda está me encarando.
— O que foi? — articulo com os lábios, erguendo as palmas no ar.
Ele estreita os olhos e fica me observando em silêncio por um instante.
— Nada — diz ele, por fim, virando-se na cadeira e abrindo o livro.
Nick bate o lápis nas juntas dos meus dedos, olha para mim interrogativamente e volta a atenção para o livro. Se está esperando uma explicação para o que acabou de acontecer, vai ficar desapontado quando souber que não sou capaz de explicar nada. Nem eu sei o que foi que acabou de acontecer.
Durante a aula, lanço vários olhares para Jonas, que passa o resto da aula sem se virar. Quando o sinal toca, Nick salta da cadeira e tamborila os dedos na minha carteira.
— Eu. Você. Almoço — decreta ele, erguendo a sobrancelha para mim.
Ele sai da sala, e eu desvio o olhar para Jonas, que está observando, com um olhar intenso, a porta da sala pela qual Nick acabou de sair.
Pego minhas coisas e saio pela porta antes que Jonas tenha a oportunidade de puxar papo. Estou feliz de verdade que ele tenha se rematriculado, mas fiquei perturbada com a maneira como me olhou, como se fôssemos melhores amigos. Não quero que Nick nem ninguém ache que não vejo problema algum nas coisas que Jonas faz. Prefiro simplesmente não manter nenhuma ligação, mas sinto que ele não vai aceitar isso muito bem.
Vou até o armário e troco os livros, pegando o de inglês. Fico me perguntando se Shayna/Shayla vai falar comigo na sala hoje. É mais provável que não, aquilo foi 24 horas atrás. Duvido que ela tenha células suficientes no cérebro para se lembrar de informações tão antigas.
— Oi, você.
Aperto os olhos apreensivamente, fechando-os, sem querer me virar e vê-lo parado com toda sua beleza.
— Você veio. — Ajeito os livros no armário e me viro para ele, que sorri e se apoia no armário ao lado do meu.
— Você fica bonita quando se arruma — diz ele, me olhando de cima a baixo. — Mas sua versão suada também não é nada mal.
Ele também fica bonito quando se arruma, mas eu é que não vou dizer isso a ele.
— Está aqui para me perseguir ou se rematriculou mesmo?
Ele sorri maliciosamente e tamborila os dedos no armário.
— Os dois.
Preciso mesmo parar com essas piadinhas de perseguição. Seria mais engraçado se eu não achasse que ele realmente é capaz de fazer isso.
Olho para o corredor que está se esvaziando.
— Bem, preciso ir — digo. — Bem-vindo de volta.
Ele estreita os olhos para mim, quase como se pudesse perceber meu constrangimento.
— Você está estranha.
Reviro os olhos com o julgamento. Como ele pode saber o jeito que estou me comportando? Nem sequer me conhece. Volto meu olhar para o armário e tento disfarçar os verdadeiros pensamentos que explicam minha “estranheza”. Pensamentos como: por que seu passado não me assusta tanto quanto deveria? Por que ele é tão esquentado a ponto de fazer o que fez com aquele pobre garoto no ano passado? Por que está gastando tanta energia para correr comigo? Por que saiu perguntando por aí sobre mim? Em vez de admitir que essas perguntas estão na minha cabeça, dou de ombros e digo:
— Estou surpresa por ver você aqui, só isso.
Ele apoia o ombro no armário ao lado do meu e balança a cabeça.
— Não. É alguma outra coisa. O que há de errado?
Suspiro e encosto no armário.
— Quer que eu seja sincera?
— É tudo que sempre quero que seja.
Aperto os lábios, formando uma linha firme, e concordo com a cabeça.
— Tudo bem — digo. Viro o ombro, encostando no armário, e fico de frente para ele. — Não quero que fique com uma impressão errada das coisas. Você dá em cima de mim e diz coisas como se tivesse certas intenções comigo, só que eu não quero que a recíproca seja verdadeira. E você é... — Paro, procurando a palavra correta.
— Sou o quê? — diz ele, me analisando atentamente.
— Você é... intenso. Intenso demais. E instável. E um pouco assustador. E tem mais outra coisa — digo, sem revelar qual é. — Não quero que fique com uma impressão errada.
— Que outra coisa? — pergunta ele, como se soubesse exatamente a que estou me referindo, mas quisesse me desafiar a dizê-lo em voz alta.
Solto o ar e pressiono as costas no armário, encarando meus pés.
— Você sabe — digo, sem querer mencionar seu passado, assim como ele provavelmente também não quer.
Jonas aproxima-se, põe a mão no armário ao lado da minha cabeça e se inclina para perto de mim. Ergo o olhar e vejo que ele está me encarando, a menos de 15 centímetros de meu rosto.
— Eu não sei, porque você está evitando falar qual é esse problema que tem comigo, como se tivesse medo demais de dizer o que é. Fale logo.
Ao olhar para Jonas então, me sentindo encurralada, o mesmo pânico de quando ele foi embora, após a primeira vez que nos encontramos, reaparece em meu peito.
— Ouvi falar do que você fez — digo abruptamente. — Sei que bateu em um cara. Sei que foi preso. Sei que, nesses dois dias desde que nos conhecemos, me deixou bastante apavorada pelo menos três vezes. E, como estamos sendo sinceros, também sei que se andou perguntando por aí sobre mim, então é claro que ouviu falar da minha reputação, assim é mais do que provável que só esteja gastando essa energia toda comigo por causa disso. Odeio ter de desapontá-lo, mas não vou transar com você. Não quero que fique achando que vai acontecer algo entre nós além do que já está acontecendo. Corremos juntos. Só isso.
Vejo que sua mandíbula está retesada, mas a expressão em seu rosto continua a mesma. Ele abaixa o braço e dá um passo para trás, dando espaço para que eu recupere o fôlego. Não entendo por que fico sem ar toda vez que ele entra no meu espaço pessoal. E entendo menos ainda por que gosto dessa sensação.
Pressiono os livros no peito e vou passando por ele, mas um braço cerca minha cintura e me puxa para longe de Jonas. Olho para o lado e vejo Zac observando Jonas de cima a baixo, segurando minha cintura com mais força.
— Jonas — diz Zac friamente. — Não sabia que ia voltar.
Jonas nem percebe a presença de Zac. Ele continua me encarando por vários segundos, desviando o olhar apenas para a mão de Zac agarrada à minha cintura. Ele balança um pouco a cabeça e sorri, como se tivesse acabado de perceber alguma coisa, e olha mais uma vez para mim.
— Pois é, estou de volta — diz ele secamente, sem olhar para Zac.
O que diabos é isso? De onde foi que Zac surgiu, e por que ele está com o braço em volta da minha cintura como se fosse seu direito?
Jonas desvia o olhar e se vira, mas para de repente. Gira o corpo de volta e olha para mim.
— Os testes para a equipe de atletismo acontecem na quinta depois das aulas — diz ele. — Você devia ir.
E então ele vai embora.
Pena que Zac não fez o mesmo.
— Tem alguma coisa para fazer no sábado? — diz Zac no meu ouvido, puxando-me para ele.
Empurro seu peito e afasto meu pescoço.
— Pare — digo, irritada. — Acho que fui bastante clara no fim de semana passado.
Bato a porta do armário e vou embora, me perguntando como diabos escapei desses dramas a vida inteira para agora conseguir material para um livro inteiro em apenas dois dias.
Nick senta-se na minha frente e me entrega um refrigerante.
— Não tinha café, mas consegui cafeína.
Sorrio.
— Obrigada, melhor amigo do mundo inteiro.
— Não me agradeça, trouxe isso com más intenções. Quero suborná-la para descobrir os podres de sua vida amorosa.
Rio e abro a latinha.
— Bem, vai ficar desapontado, pois minha vida amorosa é inexistente.
Ele abre o próprio refrigerante e sorri.
— Ah, duvido. Não com o bad boy ali encarando você daquele jeito. — Ele aponta com a cabeça para a direita.
Jonas está a três mesas de distância, olhando para mim. Está sentado com vários garotos do time de futebol, que parecem animados por tê-lo de volta. Estão dando tapinhas em suas costas e falando ao seu redor, sem perceberem, nem por um instante, que Jonas não está participando da conversa. Ele toma um gole d’água, sem desviar os olhos de mim. Depois pousa a bebida de volta na mesa, exagerando um pouco na força, e aponta com a cabeça para a direita ao se levantar. Olho para a direita e vejo a saída do refeitório. Ele está indo para lá, esperando que eu o siga.
— Hum — digo, mais para mim do que para Nick.
— Pois é. Hum. Vá ver o que diabos ele quer e depois venha me contar tudo o que aconteceu.
Tomo mais um gole de refrigerante e o coloco na mesa.
— Sim, senhor.
Meu corpo quer se levantar e ir atrás dele, mas deixo o coração na mesa. Tenho certeza de que ele pulou para fora do peito assim que vi Jonas me chamando. Posso esconder isso tudo de Nick o quanto quiser, mas, caramba, seria bom se eu fosse capaz de controlar meus órgãos; pelo menos um pouquinho.
Jonas está vários metros a minha frente. Ele empurra as portas, que se fecham após sua passagem. Coloco a mão nas portas ao alcançá-las, e hesito por um instante antes de sair para o corredor. Acho que preferia cumprir uma suspensão a ter de ir conversar com ele. Meu estômago está tão embrulhado que mais parece um presente.
Olho para os dois lados, mas não o vejo. Dou alguns passos até chegar ao fim dos armários e dar a volta. Ele está encostado num deles, com o joelho dobrado e o pé apoiado na porta. Os braços estão cruzados no peito, e ele está olhando direto para mim. O tom azul-claro de seus olhos não tem nem a bondade de disfarçar a raiva que há por trás deles.
— Você está saindo com Zac?
Reviro os olhos, vou até os armários na frente dele para me apoiar ali. Já estou cansando de suas variações de humor, e olha que acabei de conhecê-lo.
— Isso importa?
Estou curiosa para saber por que isso é da conta dele. Jonas faz aquela pausa silenciosa que, pelo que percebi, antecede quase tudo o que ele diz.
— Ele é um babaca.
— Às vezes você também é — digo depressa, sem precisar de tanto tempo quanto ele para responder.
— Ele não vai fazer bem para você.
Solto uma risada exasperada.
— E você vai? — pergunto, devolvendo o argumento dele imediatamente. Se estivéssemos marcando a pontuação, diria que está dois a zero para mim.
Ele abaixa os braços e se vira para os armários, batendo num deles com a palma da mão. O som da pele contra o metal reverbera pelo corredor, vindo parar direto no meu estômago.
— Não me inclua nisso — diz ele, virando-se de volta. — Estou falando sobre Zac, não sobre mim. Você não devia estar com ele. Não faz ideia do tipo de pessoa que ele é.
Eu rio. Não porque ele é engraçado... mas porque está falando sério. Esse cara que mal conheço está mesmo me dizendo com quem devo ou não sair? Encosto a cabeça no armário, sendo dominada pela frustração.
— Dois dias, Jonas. Conheço você há apenas dois dias. — Eu me distancio dos armários e vou até ele. — Nesses dois dias, já vi cinco personalidades diferentes suas, e somente uma delas era agradável. O fato de você achar que tem o direito até mesmo de dar sua opinião sobre mim ou minhas decisões é um absurdo. É ridículo.
Jonas cerra os dentes e fica me encarando, com os braços firmemente cruzados. Ele dá um passo desafiador em minha direção. Os olhos dele estão tão frios e intensos que estou começando a achar que o que estou vendo agora é uma sexta personalidade. Uma ainda mais furiosa, mais possessiva.
— Não gosto dele. E quando vejo coisas desse tipo? — Ele leva a mão até meu rosto e passa o dedo delicadamente embaixo do machucado chamativo em meu olho. — E depois o vejo com o braço a seu redor? Me desculpe se fico me comportando de uma maneira um pouco ridícula.
As pontas de seus dedos encostando em minha maçã do rosto me deixam sem ar. Preciso me esforçar bastante para não fechar os olhos e me inclinar em direção à palma da sua mão, mas continuo firme. Estou construindo uma certa imunidade contra esse garoto. Ou... pelo menos estou tentando. Enfim, essa é minha nova meta.
Dou um passo para longe até a mão dele deixar de encostar no meu rosto. Ele dobra os dedos, cerrando o punho, e deixa a mão ao lado do corpo.
— Você acha que devo ficar longe de Zac porque tem medo de que ele seja esquentado? — Inclino a cabeça para o lado e estreito os olhos para ele. — Isso é um pouco hipócrita, não acha?
Após mais alguns segundos me observando, ele solta um breve suspiro e revira os olhos quase imperceptivelmente. Desvia o olhar e balança a cabeça, segurando a nuca. Depois fica parado nessa posição por vários segundos, de costas para mim. Após se virar devagar, não me olha nos olhos. Cruza os braços mais uma vez e olha para o chão.
— Ele bateu em você — diz ele, sem nenhuma inflexão na voz e com a cabeça ainda direcionada para o chão, mas olha para mim por entre os cílios. — Ele já bateu em você alguma vez?
Lá vai ele de novo, induzindo minha submissão com uma simples mudança de comportamento.
— Não — digo baixinho. — E não. Já disse... foi um acidente.
Ficamos nos encarando em total silêncio até o sinal para o segundo almoço tocar e o corredor se encher de alunos. Sou a primeira a desviar o olhar.
Volto para o refeitório sem virar para trás.

*****

Happy Lovatic Day, princesas  
Bom, eu não vou fazer textinho porque, primeiro, não sou boa com palavras e, segundo, porque o que eu sinto pela Demi é algo tão grandioso, que eu não sei como expressar, seria como se eu me "despisse", expondo-me de uma forma muito profunda, então, por enquanto, prefiro guardar pra mim
Não querendo ser chata, mas eu to zangada pela falta de comentário, e se continuar assim a fic inteira, eu não vou postar mais nenhuma depois dessa, porque vocês já sabem de tudo isso e bla bla bla, acho que não tenho que ficar dando sermãozinho em vocês.
E obrigada a quem comenta, significa muito.
Amo vcs

27.1.15

Capítulo Três




Segunda-feira, 27 de agosto de 2012
17h25

Meus pulmões estão doendo; meu corpo ficou dormente faz tempo, na Aspen Road. Deixei de inspirar e expirar ritmicamente e passei a soltar arfadas descontroladamente. Costuma ser esse o momento em que mais gosto na corrida. Quando todas as células do meu corpo trabalham para me fazer seguir em frente, permitindo que me concentre apenas no próximo passo e nada mais.
No próximo passo.
Nada mais.
Jamais corri até tão longe. Costumo parar quando sei que completei meus dois quilômetros e meio, o que foi há algumas quadras atrás, mas dessa vez não. Apesar do desespero familiar do meu corpo neste momento, não estou conseguindo fazer a mente se desligar. Continuo correndo na esperança de que isso aconteça, mas hoje está demorando bem mais que o normal. A única coisa que me faz decidir parar é o fato de que vou ter de correr exatamente a mesma distância na volta para casa. Minha água também está acabando.
Paro no início de um jardim e me apoio na caixa de correio, abrindo a tampa da garrafa de água. Enxugo o suor da testa com o dorso do braço e levo a garrafa aos lábios, conseguindo tomar umas quatro gotas antes de ela acabar. Já bebi uma garrafa inteira por causa do calor do Texas. Eu me repreendo silenciosamente por ter decidido não ir correr pela manhã. Sou a maior molenga no calor.
Temendo ficar desidratada, decido voltar para casa andando, e não correndo. Acho que me forçar e chegar ao ponto da exaustão física não deixaria Dianna muito contente. Só por eu correr sozinha já a deixo nervosa.
Começo a andar quando ouço uma voz familiar atrás de mim.
— Oi, você.
Como se meu coração não estivesse acelerado o suficiente, me viro devagar e vejo Jonas me encarando, sorrindo, com as covinhas aparecendo no canto da boca. Seu cabelo está molhado de suor, e é óbvio que ele também estava correndo.
Pisco duas vezes, quase acreditando que é uma miragem causada pelo cansaço. O instinto está me dizendo para gritar e sair correndo, mas meu corpo quer se jogar nos braços brilhantes e suados do garoto.
Meu corpo é um maldito traidor.
Por sorte, ainda não me recuperei do trecho que acabei de correr, então ele não vai perceber que minha respiração está inconstante porque o estou vendo de novo.
— Oi — digo, ofegante.
Faço meu melhor para continuar olhando para seu rosto, mas não consigo evitar que meus olhos se dirijam para abaixo de seu pescoço. Por isso, passo a observar somente meus próprios pés para evitar o fato de que ele só está de bermuda e tênis de corrida. A maneira como a bermuda cai no seu quadril é razão suficiente para eu perdoar todas as coisas negativas que descobri sobre ele. Desde que me lembro, nunca fui o tipo de garota que fica toda encantada por um menino devido à sua aparência. Estou me sentindo superficial. Ridícula. Babaca, até. E um pouco irritada comigo mesma por deixar ele me afetar assim.
— Você corre? — pergunta ele, apoiando o cotovelo na caixa de correio.
Faço que sim com a cabeça.
— Costumo correr de manhã. Não lembrava como era quente à tarde. — Tento olhar de volta para ele, levando a mão até os olhos para protegê-los do sol que brilha em cima de sua cabeça como se fosse uma auréola.
Que irônico.
Ele estende o braço, e eu me contorço antes de perceber que está apenas me entregando sua garrafa de água. A maneira como ele está pressionando os lábios, segurando-se para não sorrir, deixa na cara que notou o quanto estou nervosa por estar perto dele.
— Beba isso. — Ele inclina a garrafa pela metade para mim. — Você parece exausta.
Normalmente eu não aceitaria água de estranhos. Muito menos de pessoas que sei que são sinônimo de encrenca, mas estou com sede. Com tanta sede.
Pego a garrafa de suas mãos e inclino a cabeça para trás, dando três goles enormes. Estou morrendo de vontade de tomar o resto, mas não posso deixá-lo sem nada.
— Obrigada — digo, devolvendo a garrafa. Limpo a boca com a mão e olho para a calçada atrás de mim. — Bem, tenho mais dois quilômetros e meio de volta, então é melhor eu ir.
— Está mais para quatro quilômetros — diz ele, olhando para minha barriga.
Ele pressiona a boca na garrafa sem limpar a beirada, mantendo os olhos fixos em mim enquanto inclina a cabeça para trás e toma o resto da água.
Não consigo deixar de ficar observando seus lábios cobrirem o gargalo da garrafa onde os meus acabaram de encostar. Estamos praticamente nos beijando.
Balanço a cabeça.
— Hã? — Não sei se ele falou algo em voz alta ou não. Estou mais concentrada no suor pingando no seu peito.
— Eu disse que está mais para quatro quilômetros. Você mora na Conroe, que fica a quase quatro quilômetros daqui. São quase oito quilômetros, ida e volta — diz ele, como se estivesse impressionado.
Lanço um olhar curioso para ele.
— Sabe em que rua eu moro?
— Sei.
Ele não entra em detalhes. Fico o encarando, em silêncio, esperando alguma explicação.
Jonas percebe que não estou satisfeita com o “sei” e suspira.
— Demetria Devonne Lovato, nascida em 29 de setembro. Conroe Street, 1455. 1,60m. Doadora.
Dou um passo para trás, subitamente vendo meu assassinato próximo se desenrolando pelas mãos do meu lindo perseguidor. Será que eu devia parar de proteger minha visão do sol para poder observá-lo melhor caso eu consiga fugir? Talvez precise descrevê-lo para um desenhista na polícia.
— Sua identidade — explica ele ao ver a mistura de terror e confusão no meu rosto. — Você me mostrou sua identidade mais cedo. No mercado.
Por alguma razão, essa justificativa não diminui minha apreensão.
— Você a olhou por dois segundos.
Ele dá de ombros.
— Tenho boa memória.
— E persegue as pessoas — digo inexpressivamente.
Ele ri.
— Eu persigo? É você que está na frente da minha casa. — E aponta por cima do ombro para a casa atrás dele.
Aquela casa é dele? Qual a probabilidade de isso acontecer?
Ele endireita a postura e tamborila os dedos nas letras na frente da caixa de correio.
Família Jonas.
Sinto o sangue fluindo para as bochechas, mas isso não importa. Depois de uma corrida no meio da tarde, no calor do Texas e com pouca água, tenho certeza de que meu corpo inteiro está vermelho. Tento não olhar novamente para a casa dele, mas curiosidade é meu fraco. É uma casa simples, não muito chamativa. Combina com a vizinhança de classe média. Assim como o carro na entrada da garagem. Será que é o carro dele? Pela conversa com a fulana de tal do mercado, dá para deduzir que ele é da minha idade, então deve morar com os pais. Mas como é que eu nunca o tinha visto antes? Como é que eu não sabia que morava a menos de 5 quilômetros do único garoto do planeta que consegue me provocar ondas de calor e frustração?
Limpo a garganta.
— Bem, obrigada pela água. — Não tem nada que eu queira mais no mundo que fugir desse constrangimento. Aceno brevemente e começo a correr.
— Espere aí — grita ele atrás de mim. Não desacelero, então ele passa por mim e se vira, correndo para trás contra o sol. — Deixe eu encher sua garrafa. — Ele estende o braço e pega a garrafa de minha mão esquerda, encostando sua mão em minha barriga. Congelo mais uma vez. — Já volto — diz dele, correndo para dentro de casa.
Estou perplexa. Que ato de bondade mais contraditório. Será que é mais um efeito do transtorno de múltiplas personalidades? É provável que ele seja um mutante, como o Hulk. Ou como em O médico e o monstro. Será que Joseph é a personalidade boazinha e Jonas, a assustadora? Com certeza foi Jonas que vi no mercado mais cedo. Acho que gosto bem mais de Joseph.
Fico um pouco constrangida de esperar, então volto para perto da casa dele, parando às vezes para olhar o caminho que vai dar na minha. Não faço ideia do que fazer. Sinto que qualquer decisão que eu tomar a essa altura vai para o lado da balança que mede as burrices.
Será que devo ficar?
Será que devo correr?
Será que devo me esconder nos arbustos antes que ele volte com algemas e uma faca?
Antes que eu tenha a oportunidade de sair correndo, a porta da casa se escancara, e ele aparece com a garrafa cheia. Dessa vez o sol está atrás de mim, por isso não tenho tanta dificuldade em enxergá-lo. O que também não é uma coisa boa, pois tudo o que quero fazer é ficar encarando o garoto.
Argh! Odeio muito a luxúria.
O-dei-o.
Cada célula sabe que ele não é uma boa pessoa, mas meu corpo parece não dar a mínima para isso.
Ele me entrega a garrafa, e, na mesma hora, tomo mais um gole. Já odeio o calor do Texas naturalmente, mas, combinado a Joseph Jonas, parece que estou nas profundezas do Inferno.
— Então... mais cedo... no mercado... — diz ele, fazendo uma pausa nervosa. — Se a deixei constrangida, peço desculpas.
Meus pulmões estão implorando por ar, mas, de alguma maneira, consigo dar um jeito de responder:
— Você não me deixou constrangida.
Você meio que me deixou apavorada.
Jonas estreita os olhos para mim por alguns segundos, me observando. Hoje descobri que não gosto de ser observada... prefiro não ser percebida.
— Também não estava tentando dar em cima de você — afirma ele. — Só achei que fosse outra pessoa.
— Está tudo bem. — Forço um sorriso, mas não está tudo bem. Por que de repente estou sendo consumida pelo desapontamento de ele não ter tentado dar em cima de mim? Devia estar contente.
— O que não quer dizer que eu não daria em cima de você — acrescenta ele sorrindo. — Só não estava fazendo isso naquele momento.
Ah, obrigada, meu Deus. O esclarecimento me faz sorrir, apesar de todos os meus esforços em contrário.
— Quer que eu corra com você? — pergunta ele, apontando com a cabeça em direção à calçada atrás de mim.
Sim, por favor.
— Não, está tudo bem.
Ele balança a cabeça.
— Bem, eu estava indo naquela direção de qualquer jeito. Corro duas vezes ao dia e ainda tenho alguns... — Ele para de falar no meio da frase e dá um passo para perto de mim rapidamente. Em seguida, segura meu queixo e inclina minha cabeça para trás. — Quem fez isso com você? — A mesma frieza que vi em seus olhos no mercado reaparece.
— Seu olho não estava assim mais cedo.
Afasto meu queixo e rio.
— Foi um acidente. Jamais interrompa o cochilo de uma garota.
Ele não sorri. Em vez disso, se aproxima mais, me observa atentamente e passa o dedão embaixo do meu olho.
— Você contaria para alguém, não é? Se fizessem isso com você?
Quero responder. Quero mesmo. Mas não consigo. Ele está tocando meu rosto. Sua mão está na minha bochecha. Não consigo pensar, não consigo falar, não consigo respirar. A intensidade proveniente de toda sua existência suga o ar dos meus pulmões e a força dos meus joelhos. Balanço a cabeça de maneira não muito convincente. Ele franze a testa e afasta a mão.
— Vou correr com você — afirma ele, pondo as mãos nos meus ombros e me virando na direção oposta para me dar um leve empurrão. Ele entra no mesmo ritmo que eu, e passamos a correr em silêncio.
Quero conversar com ele. Quero perguntar sobre o ano que passou na prisão, por que desistiu do colégio, o porquê daquela tatuagem... mas tenho medo das respostas. Sem falar que estou completamente sem fôlego. Em vez disso, corremos em total silêncio até chegarmos a minha casa.
Ao nos aproximarmos da entrada, começamos a andar. Não faço ideia de como terminar isso. Ninguém jamais corre comigo, então não sei o que manda a etiqueta quando dois corredores se despedem. Eu me viro e dou um breve aceno para ele.
— Então até qualquer hora?
— Com certeza — diz ele, me encarando.
Sorrio constrangida e me viro. Com certeza? Fico pensando nisso enquanto cruzo a entrada. O que ele quis dizer com isso? Nem tentou pegar o número do meu telefone, apesar de não saber que não tenho um. Não perguntou se eu queria correr com ele de novo. Mas disse com certeza como se tivesse absoluta certeza, e eu meio que espero que isso seja mesmo verdade.
— Demi, espere. — A maneira como sua voz pronuncia meu nome me faz desejar que a única palavra de todo seu vocabulário fosse Demi. Eu me viro, rezando para que ele não mande mais uma daquelas cantadas bregas. Porque agora eu totalmente cairia.
— Pode me fazer um favor?
Qualquer coisa. Faço qualquer coisa que me pedir enquanto estiver sem camisa.
— Sim?
Ele joga sua garrafa de água para mim. Eu a pego e olho para a garrafa vazia, sentindo-me culpada por não ter me oferecido para enchê-la. Balanço-a no ar e faço que sim com a cabeça, em seguida subo os degraus correndo e entro em casa. Dianna está enchendo o lava-louça quando irrompo na cozinha. Assim que a porta da frente se fecha atrás de mim, arfo para poder dar aos meus pulmões o ar pelo qual estavam implorando.
— Meu Deus, Demi. Parece até que vai desmaiar. Sente-se. — Ela pega a garrafa das minhas mãos e me obriga a sentar. Deixo que ela a encha enquanto inspiro pelo nariz e expiro pela boca. Ela se vira, entrega-a para mim, e fecho a tampa. Em seguida, me levanto e corro lá para fora até Jonas.
— Obrigado — diz ele. Fico parada, observando-o pressionar aqueles mesmos lábios carnudos na boca da garrafa.
Estamos praticamente nos beijando de novo.
Não consigo distinguir o efeito da minha corrida de quase 8 quilômetros do efeito que Jonas provoca em mim. As duas coisas fazem com que me sinta prestes a desmaiar por falta de oxigênio. Ele fecha a tampa da garrafa, e seus olhos percorrem meu corpo, parando por tempo demais em minha barriga à mostra antes de me olhar nos olhos.
— Você faz atletismo?
Cubro a barriga com o braço esquerdo e ponho as mãos na cintura.
— Não. Mas estou pensando em tentar entrar para a equipe.
— Devia mesmo. Mal consegue respirar e mesmo assim acabou de correr quase oito quilômetros — diz ele. — Você está no último ano?
Ele não faz ideia do esforço que estou precisando fazer para não desabar na calçada e ficar chiando por falta de ar. Jamais corri tanto de uma só vez e estou usando todas as minhas forças para aparentar que isso não foi nada de mais. Pelo jeito está dando certo.
— Já devia saber que estou no último ano, não? Suas habilidades de perseguidor estão deixando a desejar.
Quando as covinhas dele reaparecem, fico com vontade de cumprimentar a mim mesma.
— Bem, é meio difícil perseguir você — diz ele. — Não a encontrei nem no Facebook.
Ele acabou de admitir que me procurou no Facebook. Eu o conheci há menos de duas horas, então o fato de ele ter ido direto para casa e me procurado no Facebook me deixa um pouco lisonjeada. Um sorriso involuntário surge no meu rosto, e fico com vontade de esmurrar esse ridículo arremedo de garota que tomou conta do meu ser normalmente indiferente.
— Não estou no Facebook. Não uso internet — explico.
Jonas lança um olhar para mim e abre um sorriso sarcástico, como se não estivesse acreditando em nada disso. Ele afasta o cabelo da testa.
— E seu celular? Não dá para usar internet no celular?
— Não tenho celular. Minha mãe não é fã dessas novas tecnologias. Também não tenho televisão.
— Caraca. — Ele ri. — Está falando sério? O que faz para se divertir?
Sorrio para ele e dou de ombros.
— Eu corro.
Jonas me observa mais uma vez, focando a atenção por um breve instante na minha barriga. Vou repensar essa história de sair de top de ginástica.
— Bem, então por acaso você não saberia o horário em que uma certa pessoa se levanta para correr de manhã, saberia? — Ele me olha, e não consigo ver de jeito nenhum a pessoa que Miley descreveu para mim. A única coisa que vejo é um garoto flertando com uma menina, o olhar um pouco nervoso e cativante.
— Não sei se você ia gostar de acordar tão cedo — digo. A maneira como ele está me olhando e o calor do Texas fazem minha vista se embaçar de repente, então respiro fundo, com o intuito de aparentar qualquer coisa diferente de exaustão e agitação.
Ele inclina a cabeça para perto da minha e estreita os olhos.
— Você não tem ideia do quanto eu quero acordar tão cedo assim. — Ele abre aquele sorriso com as covinhas, e eu desmaio.
Sim... literalmente. Desmaiei.
E, pela dor no meu ombro e o cascalho e terra grudados na minha bochecha, não foi uma queda bonita e graciosa. Apaguei e bati no chão antes mesmo que ele tivesse qualquer chance de me segurar. Tão diferente dos heróis nos livros.
Estou deitada no sofá, presumivelmente onde ele me deixou após ter me carregado para dentro de casa. Dianna está parada ao meu lado com um copo
d’água, e Jonas, atrás dela, observando o desenrolar do momento mais vergonhoso de minha vida.
— Demi, tome um pouco d’água — diz Dianna, erguendo minha nuca e me pressionando em direção ao copo. Bebo um gole, encosto no travesseiro e fecho os olhos, querendo mais que tudo desmaiar outra vez. — Vou pegar um pano úmido.
Abro os olhos, esperando que Jonas tenha decidido ir embora despercebido depois que Dianna saiu do cômodo, mas ele continua aqui. E agora está mais perto de mim. Ele se ajoelha no chão ao meu lado e estende a mão para meu cabelo, tirando o que imagino ser cascalho ou alguma sujeira.
— Tem certeza de que está bem? Você caiu bem feio. — Seus olhos estão cheios de preocupação, e ele limpa algo da minha bochecha com o polegar, depois apoia a mão ao meu lado no sofá.
— Ah, meu Deus — digo, cobrindo os olhos com o braço. — Mil desculpas. Estou morrendo de vergonha.
Jonas segura meu punho e afasta meu braço do rosto.
— Shh. — A preocupação nos olhos dele diminui, e um sorriso brincalhão toma conta de suas feições. — Meio que estou curtindo isso.
Dianna volta para a sala
— Aqui está o pano, querida. Quer algo para a dor? Está enjoada? — Em vez de entregá-lo para mim, ela o deixa com Jonas e volta para a cozinha. — Devo ter um pouco de extrato de calêndula ou de bardana.
Ótimo. Como se eu já não estivesse morrendo de vergonha, ela está prestes a piorar ainda mais a situação me obrigando a tomar uma de suas misturas caseiras bem na frente dele.
— Estou bem, mãe. Não estou com dor alguma.
Delicadamente, Jonas põe o pano na minha bochecha, limpando-a.
— Talvez não esteja sentindo dor agora, mas depois vai sentir, sim — diz ele, baixinho demais para que Dianna escutasse. Ele para de examinar minha bochecha e olha nos meus olhos. — Você devia tomar alguma coisa, só para garantir.
Não sei por que a sugestão parece mais simpática quando sai de sua boca e não da de Dianna, mas concordo com a cabeça. E engulo em seco. E prendo a respiração. E aperto as coxas uma contra a outra. Também tento me sentar, porque ficar deitada no sofá com ele tão perto de mim está quase me fazendo desmaiar de novo.
Quando ele vê o esforço para me sentar, segura meu cotovelo e me ajuda. Dianna volta para a sala e me entrega um pequeno copo de suco de laranja. Suas misturas são amargas demais, por isso tenho de tomar com suco para não acabar cuspindo tudo. Pego o copo da mão dela, bebendo tudo o mais rapidamente que já tomei algo na vida, e imediatamente o devolvo. Só quero que ela volte para a cozinha.
— Desculpe — diz ela, estendendo a mão para Jonas. — Meu nome é Dianna Lovato.
Jonas se levanta e aperta a mão dela.
— Joseph Jonas. Meus amigos me chamam de Jonas.
Fico com inveja por ela estar tocando na mão dele. Quero pegar uma senha e entrar na fila.
— De onde você e Demi se conhecem? — pergunta ela.
Jonas olha para mim na mesma hora em que ergo o olhar para ele. Seu lábio mal se curva, formando um sorriso, mas eu percebo.
— Na verdade, não nos conhecemos — diz ele, olhando para ela. — Acho que eu estava no lugar certo na hora certa, só isso.
— Bem, agradeço por tê-la ajudado. Não sei por que ela desmaiou. Ela nunca havia desmaiado. — Dianna olha para mim. — Você comeu alguma coisa hoje?
— Um pedaço de frango no almoço — respondo, sem mencionar o Snickers que comi antes da corrida. — A comida do refeitório é um lixo.
Ela revira os olhos e ergue as mãos para o ar.
— Por que foi correr sem antes comer?
Dou de ombros.
— Esqueci. Não costumo correr à tarde.
Ela volta para a cozinha com o copo e suspira fundo.
— Não quero que corra mais, Demi. O que poderia ter acontecido se estivesse sozinha? Além disso, você corre demais.
Ela só pode estar brincando. Não posso parar de correr de jeito nenhum.
— Olhe — diz Jonas, observando o resto de cor se esvair do meu rosto. Ele olha para Dianna na cozinha. — Moro aqui perto, na Ricker, e passo correndo por aqui todas as tardes. — (Ele está mentindo. Eu teria percebido). — Se isso a deixar mais tranquila, seria ótimo correr com ela na próxima semana ou durante as manhãs. Costumo correr nas pistas do colégio, mas não tem problema. Só para garantir que isso não vai acontecer de novo.
Ah. Uma luzinha se acende em minha cabeça.
Claro que esse abdômen me pareceu familiar.
Dianna volta para a sala e olha para mim, depois para ele. Ela sabe o quanto gosto de minhas corridas solitárias, mas dá para ver em seus olhos que ficaria mais tranquila se eu tivesse um parceiro de corrida.
— Por mim tudo bem — assegura ela, olhando para mim. — Se Demi gostar da ideia.
Sim, sim, gosto. Mas só se meu novo parceiro de corrida estiver sem camisa.
— Gosto — confirmo. Eu me levanto e, ao fazer isso, fico tonta mais uma vez. Acho que também fico pálida, pois Jonas põe a mão no meu ombro em menos de um segundo, me fazendo voltar para o sofá.
— Calma — pede ele, e olha para Dianna. — Você tem algum biscoito? Talvez ajude.
Dianna vai até a cozinha, e Jonas olha de novo para mim, os olhos cheios de preocupação.
— Tem certeza de que está bem? — Ele alisa minha bochecha com o dedo.
Estremeço.
Um sorriso diabólico surge em seu rosto ao perceber minha tentativa de cobrir os braços arrepiados. Ele olha para Dianna na cozinha e depois volta a me encarar.
— Que horas você quer que eu venha persegui-la amanhã? — sussurra ele.
— 6h30? — digo baixinho, olhando para ele, impotente.
— 6h30 está ótimo.
— Jonas, você não precisa fazer isso.
Os olhos azuis hipnotizantes ficam observando meu rosto por vários segundos, em silêncio, e não consigo deixar de encarar a boca igualmente hipnotizante enquanto ele fala.
— Sei que não preciso fazer isso, Demi. Faço o que quero fazer. — Ele se aproxima do meu ouvido e baixa a voz, passando a sussurrar. — E eu quero correr com você. — Ele se afasta e fica me observando. Devido a todo o caos em minha cabeça e estômago, não consigo responder.
Dianna volta com os biscoitos.
— Coma — diz ela, colocando-os na minha mão.
Jonas levanta-se, despede-se de Dianna e depois se volta para mim.
— Se cuida. Vejo você de manhã?
Faço que sim com a cabeça e o observo enquanto ele se vira para ir embora. Não consigo tirar os olhos da porta depois que ele a fecha. Estou perdendo a cabeça. Perdi totalmente qualquer resquício de autocontrole. Então é isso que Miley ama? Isso é luxúria?
Odeio a luxúria. Sem dúvida alguma. Odeio totalmente essa sensação linda e mágica.
— Ele é tão legal — diz Dianna. — E bonito. — Ela se vira para mim. — Você não o conhece?
Dou de ombros.
— Já ouvi falar dele — digo. E é tudo o que revelo.
Se ela soubesse o quanto meu “parceiro de corrida” é um caso perdido, acabaria surtando. Quanto menos ela souber sobre Joseph Jonas, melhor para nós duas.

Segunda-feira, 27 de agosto de 2012
19h10

— O que diabos aconteceu com seu rosto? — Eddie solta meu queixo e passa por mim indo em direção à geladeira.
Eddie está presente na vida de Dianna há cerca de um ano e meio. Janta conosco algumas vezes por semana e, como hoje é o jantar de despedida de Miley, ele nos deu a honra de sua presença. Por mais que goste de pegar no pé de Miley, sei que também vai sentir sua falta.
— Briguei na rua hoje — respondo.
Ele ri.
— Então foi isso o que aconteceu com a rua.
Miley escolhe uma fatia de pão e abre o pote de Nutella. Pego o prato e me sirvo com a mais recente invenção vegana de Dianna. Sua culinária é uma coisa à qual é preciso se acostumar, algo que Miley ainda não conseguiu depois de quatro anos. Eddie, por outro lado, é o gêmeo encarnado de Dianna, então não se incomoda com a comida. O menu de hoje é algo cujo nome nem consigo pronunciar, mas não tem nenhuma derivação animal, como sempre. Dianna não me obriga a consumir apenas comidas vegana, então experimento o que quero quando não estou em casa.
Tudo o que Miley come serve apenas como complemento ao seu prato principal — a Nutella. Hoje ela escolheu um sanduíche de queijo com Nutella. Não sei se eu seria capaz de me acostumar a isso.
— Então, quando vai se mudar para cá? — pergunto a Eddie.
Ele e Dianna têm discutido o próximo passo na relação, mas jamais conseguem concordar quanto à rigorosa regra antitecnologia dela. Bem, Eddie não consegue aceitar isso. Já Dianna está muito bem resolvida com esse assunto.
— Quando sua mãe ceder e assinar a ESPN — diz Eddie.
Eles não discutem sobre isso. Acho que os dois estão satisfeitos com a situação atual, então nenhum deles está com muita pressa de sacrificar as opiniões divergentes em relação à tecnologia moderna.
— Demi desmaiou na rua hoje — diz Dianna, mudando de assunto. — Um garotinho encantador carregou ela para dentro de casa.
Eu acho graça.
— Um cara, mãe. Por favor, não diga garotinho.
Do outro lado da mesa Miley me fulmina com o olhar e percebo que não lhe contei da minha corrida essa tarde. Nem sobre meu primeiro dia de aula. Hoje foi um dia movimentado. Para quem será que vou confidenciar o que acontece comigo depois que ela for embora? Fico apavorada só de pensar que Miley vai estar do outro lado do mundo daqui a dois dias. Espero que Nick consiga ocupar o lugar dela. Bem, ele provavelmente adoraria isso.
— Você está bem? — pergunta Eddie. — Deve ter caído bem feio para ficar com esse olho aí.
Estendo a mão até o rosto e faço uma careta. Tinha me esquecido completamente do olho roxo.
— Isso não foi por causa do desmaio. Miley me deu uma cotovelada. Duas vezes.
Fico esperando que pelo menos um dos dois pergunte a Miley por que ela me atacou, mas nenhum deles faz isso. O que mostra o quanto eles amam minha amiga. Nem se importam se ela bate em mim; provavelmente diriam que mereci.
— Você não fica irritada por seu nome ser um número? — pergunta Eddie para ela. — Nunca entendi isso. É como quando os pais colocam no filho o nome de um dos dias da semana. — Ele faz uma pausa com o garfo no ar e olha para Dianna. — Quando tivermos um filho, não vamos fazer isso com ele. Qualquer palavra que puder ser encontrada num calendário está proibida.
Dianna o encara com uma expressão gélida. Se eu tivesse de adivinhar por sua reação, diria que é a primeira vez que Eddie falou em ter filhos. Se eu tivesse de adivinhar pelo olhar em seu rosto, diria que ter filhos não é algo que ela esteja planejando para o futuro. Nem para nunca.
Eddie volta sua atenção para Miley.
— Seu verdadeiro nome não é Destiny ou Thirteen ou algo assim? Não entendo por que escolheu Miley. Acho que é o pior número que podia ter escolhido.
— Vou aceitar seus insultos — diz Miley. — É só a maneira de disfarçar o quanto está arrasado com minha partida.
Eddie ri.
— Pode aceitar. Terei mais deles quando você voltar daqui a seis meses.
Depois que Eddie e Miley vão embora, ajudo Dianna na cozinha com os pratos. Desde que Eddie falou sobre ter filhos, ela ficou quieta demais.
— Por que isso a enlouqueceu tanto? — pergunto a ela, entregando um prato para ela lavar.
— O quê?
— Quando ele fez aquele comentário sobre os filhos de vocês. Você tem trinta e poucos anos. As pessoas têm filhos o tempo todo nessa idade.
— Foi tão óbvio assim?
— Para mim, foi.
Ela pega outro prato para lavar e depois suspira.
— Amo Eddie. Mas também amo eu e você. Gosto de como as coisas são entre nós duas e não sei se estou pronta para mudar isso, muito menos para inserir outro filho nessa história. Mas Eddie quer tanto essas coisas.
Fecho a torneira e enxugo as mãos na toalha.
— Vou fazer 18 anos em algumas semanas, mãe. Por mais que você queira que as coisas entre nós continuem as mesmas... isso não vai acontecer. Vou me mudar para a faculdade depois do próximo semestre, e você vai ficar morando aqui sozinha. Talvez não seja tão ruim considerar a ideia de pelo menos deixar ele se mudar para cá.
Ela sorri para mim, mas é um sorriso aflito, o mesmo que aparece toda vez que toco no assunto da faculdade.
— Tenho considerado essa ideia, Demi. Pode acreditar. Só que esse é um passo importante que não pode ser desfeito depois que a decisão já foi tomada.
— Mas e se for um passo que você não queira que seja desfeito? E se for um passo que só vai fazer você ter mais vontade de dar outro passo, e depois mais outro, até acabar correndo em disparada?
Ela ri.
— É exatamente disso que tenho medo.
Enxugo o balcão e lavo o pano na pia.
— Às vezes não entendo você.
— E eu também não a entendo — diz ela, cutucando meu ombro. — Sou incapaz de entender por que quis tanto estudar num colégio. Sei que disse que foi até divertido, mas me conte o que realmente achou.
Dou de ombros.
— Foi legal — minto. Minha teimosia sempre fala mais alto. Jamais vou revelar a ela o quanto odiei ir à escola hoje, mesmo sabendo que ela nunca diria “eu avisei”.
Ela seca as mãos e sorri para mim.
— Que bom. Quem sabe quando eu perguntar de novo amanhã, você me conte a verdade.
Tiro da mochila o livro que Nick me deu e o deixo em cima da cama. Leio apenas duas páginas antes de Miley entrar pela janela.
— Colégio primeiro, presente depois — diz ela, se acomodando ao meu lado na cama enquanto coloco o livro na mesinha de cabeceira.
— O colégio foi um saco. Graças a você e sua inabilidade de simplesmente dizer não aos garotos, herdei sua péssima reputação. Mas por intervenção divina, fui resgatada por Nick, o adotado mórmon gay que não sabe cantar nem atuar, mas ama ler e é meu melhor amigo no mundo inteiro.
Miley faz beicinho.
— Nem fui embora ainda e você já me substituiu? Que cruel. E, só para constar, não sou incapaz de dizer não aos garotos. Apenas não entendo as consequências morais do sexo antes do casamento. De muito e muito sexo antes do casamento.
Ela põe uma caixa no meu colo. Uma caixa desembrulhada.
— Sei o que está pensando — diz ela. — Mas fique sabendo que a falta de embrulho não demonstra o que sinto por você. Foi só preguiça.
Pego a caixa e a balanço.
— É você que está indo embora, sabia? Eu que devia estar dando um presente para você.
— É, devia mesmo. Mas você é péssima em dar presentes e não acho que vá mudar só por minha causa.
Ela tem razão. Sou péssima em dar presentes, mas isso acontece principalmente porque odeio muito receber presentes. É quase tão constrangedor quanto pessoas chorando. Viro a caixa e encontro a aba. Levanto-a e, então, abro. Removo o papel crepom, e um celular cai na minha mão.
— Miley — digo. — Sabe que não posso...
— Cale a boca. Jamais iria para o outro lado do mundo sem ter como me comunicar com você. Você não tem nem e-mail.
— Eu sei, mas não posso... não tenho emprego.
Não tenho como pagar por isso. E Dianna...
— Relaxe. É um celular pré-pago. Coloquei créditos que cobrem minutos suficientes para que a gente possa trocar uma mensagem por dia enquanto eu estiver longe. Não tenho dinheiro para fazer ligações internacionais, então quanto a isso você não deu sorte. E, só para não desobedecer os valores parentais cruéis e distorcidos de sua mãe, não tem nem internet nessa porcaria. Só dá para enviar mensagem de texto.
Ela pega o celular e liga o aparelho e, em seguida, coloca suas informações nos contatos.
— Se acabar arranjando um namorado gato enquanto eu estiver longe, pode muito bem acrescentar minutos a mais. Mas, se ele usar meus minutos, corto o saco dele fora.
Ela me devolve o celular, e pressiono o botão home. Seu nome nos contatos aparece como Sua melhor, MELHOR amiga no mundo inteiro.
Sou péssima em receber presentes e sou muito pior com despedidas. Guardo o telefone de volta na caixa e me curvo para pegar minha mochila. Tiro os livros, coloco-os no chão, me viro e balanço a mochila em cima de Demi, observando todas as notas caírem em seu colo.
— Aqui tem 37 dólares — digo. — Para você sobreviver até voltar. Feliz dia do intercâmbio.
Ela enche a mão com as notas e as joga no ar, e, em seguida, se joga na cama.
— Primeiro dia no colégio e as vacas já encheram seu armário? — Ela ri. — Impressionante.
Coloco em seu peito o cartão de despedida que escrevi, e apoio a cabeça em seu ombro.
— Achou isso impressionante? Devia ter visto meu pole dance no refeitório.
Ela pega o cartão e passa os dedos por ele, sorrindo. Não o abre, porque sabe que não gosto quando as coisas ficam constrangedoramente emotivas. Ela encosta o cartão no peito mais uma vez e apoia a cabeça no meu ombro.
— Você é a maior vagabunda — diz ela baixinho, tentando conter as lágrimas, pois somos teimosas demais para chorar.
— Pois é, foi o que me disseram.

*****

Desculpem a demora pra postar, mas tinha muita visualização pra pouco comentário, então sim, demorei de propósito.
To feliz que estejam gostando, amanhã respondo os comentários.
Já to toda chorosa pelo Lovatic Day  
Enfim, amanhã, se tiver comentários, eu posto, ok?
Bjs, amo vcs