27.1.15

Capítulo Três




Segunda-feira, 27 de agosto de 2012
17h25

Meus pulmões estão doendo; meu corpo ficou dormente faz tempo, na Aspen Road. Deixei de inspirar e expirar ritmicamente e passei a soltar arfadas descontroladamente. Costuma ser esse o momento em que mais gosto na corrida. Quando todas as células do meu corpo trabalham para me fazer seguir em frente, permitindo que me concentre apenas no próximo passo e nada mais.
No próximo passo.
Nada mais.
Jamais corri até tão longe. Costumo parar quando sei que completei meus dois quilômetros e meio, o que foi há algumas quadras atrás, mas dessa vez não. Apesar do desespero familiar do meu corpo neste momento, não estou conseguindo fazer a mente se desligar. Continuo correndo na esperança de que isso aconteça, mas hoje está demorando bem mais que o normal. A única coisa que me faz decidir parar é o fato de que vou ter de correr exatamente a mesma distância na volta para casa. Minha água também está acabando.
Paro no início de um jardim e me apoio na caixa de correio, abrindo a tampa da garrafa de água. Enxugo o suor da testa com o dorso do braço e levo a garrafa aos lábios, conseguindo tomar umas quatro gotas antes de ela acabar. Já bebi uma garrafa inteira por causa do calor do Texas. Eu me repreendo silenciosamente por ter decidido não ir correr pela manhã. Sou a maior molenga no calor.
Temendo ficar desidratada, decido voltar para casa andando, e não correndo. Acho que me forçar e chegar ao ponto da exaustão física não deixaria Dianna muito contente. Só por eu correr sozinha já a deixo nervosa.
Começo a andar quando ouço uma voz familiar atrás de mim.
— Oi, você.
Como se meu coração não estivesse acelerado o suficiente, me viro devagar e vejo Jonas me encarando, sorrindo, com as covinhas aparecendo no canto da boca. Seu cabelo está molhado de suor, e é óbvio que ele também estava correndo.
Pisco duas vezes, quase acreditando que é uma miragem causada pelo cansaço. O instinto está me dizendo para gritar e sair correndo, mas meu corpo quer se jogar nos braços brilhantes e suados do garoto.
Meu corpo é um maldito traidor.
Por sorte, ainda não me recuperei do trecho que acabei de correr, então ele não vai perceber que minha respiração está inconstante porque o estou vendo de novo.
— Oi — digo, ofegante.
Faço meu melhor para continuar olhando para seu rosto, mas não consigo evitar que meus olhos se dirijam para abaixo de seu pescoço. Por isso, passo a observar somente meus próprios pés para evitar o fato de que ele só está de bermuda e tênis de corrida. A maneira como a bermuda cai no seu quadril é razão suficiente para eu perdoar todas as coisas negativas que descobri sobre ele. Desde que me lembro, nunca fui o tipo de garota que fica toda encantada por um menino devido à sua aparência. Estou me sentindo superficial. Ridícula. Babaca, até. E um pouco irritada comigo mesma por deixar ele me afetar assim.
— Você corre? — pergunta ele, apoiando o cotovelo na caixa de correio.
Faço que sim com a cabeça.
— Costumo correr de manhã. Não lembrava como era quente à tarde. — Tento olhar de volta para ele, levando a mão até os olhos para protegê-los do sol que brilha em cima de sua cabeça como se fosse uma auréola.
Que irônico.
Ele estende o braço, e eu me contorço antes de perceber que está apenas me entregando sua garrafa de água. A maneira como ele está pressionando os lábios, segurando-se para não sorrir, deixa na cara que notou o quanto estou nervosa por estar perto dele.
— Beba isso. — Ele inclina a garrafa pela metade para mim. — Você parece exausta.
Normalmente eu não aceitaria água de estranhos. Muito menos de pessoas que sei que são sinônimo de encrenca, mas estou com sede. Com tanta sede.
Pego a garrafa de suas mãos e inclino a cabeça para trás, dando três goles enormes. Estou morrendo de vontade de tomar o resto, mas não posso deixá-lo sem nada.
— Obrigada — digo, devolvendo a garrafa. Limpo a boca com a mão e olho para a calçada atrás de mim. — Bem, tenho mais dois quilômetros e meio de volta, então é melhor eu ir.
— Está mais para quatro quilômetros — diz ele, olhando para minha barriga.
Ele pressiona a boca na garrafa sem limpar a beirada, mantendo os olhos fixos em mim enquanto inclina a cabeça para trás e toma o resto da água.
Não consigo deixar de ficar observando seus lábios cobrirem o gargalo da garrafa onde os meus acabaram de encostar. Estamos praticamente nos beijando.
Balanço a cabeça.
— Hã? — Não sei se ele falou algo em voz alta ou não. Estou mais concentrada no suor pingando no seu peito.
— Eu disse que está mais para quatro quilômetros. Você mora na Conroe, que fica a quase quatro quilômetros daqui. São quase oito quilômetros, ida e volta — diz ele, como se estivesse impressionado.
Lanço um olhar curioso para ele.
— Sabe em que rua eu moro?
— Sei.
Ele não entra em detalhes. Fico o encarando, em silêncio, esperando alguma explicação.
Jonas percebe que não estou satisfeita com o “sei” e suspira.
— Demetria Devonne Lovato, nascida em 29 de setembro. Conroe Street, 1455. 1,60m. Doadora.
Dou um passo para trás, subitamente vendo meu assassinato próximo se desenrolando pelas mãos do meu lindo perseguidor. Será que eu devia parar de proteger minha visão do sol para poder observá-lo melhor caso eu consiga fugir? Talvez precise descrevê-lo para um desenhista na polícia.
— Sua identidade — explica ele ao ver a mistura de terror e confusão no meu rosto. — Você me mostrou sua identidade mais cedo. No mercado.
Por alguma razão, essa justificativa não diminui minha apreensão.
— Você a olhou por dois segundos.
Ele dá de ombros.
— Tenho boa memória.
— E persegue as pessoas — digo inexpressivamente.
Ele ri.
— Eu persigo? É você que está na frente da minha casa. — E aponta por cima do ombro para a casa atrás dele.
Aquela casa é dele? Qual a probabilidade de isso acontecer?
Ele endireita a postura e tamborila os dedos nas letras na frente da caixa de correio.
Família Jonas.
Sinto o sangue fluindo para as bochechas, mas isso não importa. Depois de uma corrida no meio da tarde, no calor do Texas e com pouca água, tenho certeza de que meu corpo inteiro está vermelho. Tento não olhar novamente para a casa dele, mas curiosidade é meu fraco. É uma casa simples, não muito chamativa. Combina com a vizinhança de classe média. Assim como o carro na entrada da garagem. Será que é o carro dele? Pela conversa com a fulana de tal do mercado, dá para deduzir que ele é da minha idade, então deve morar com os pais. Mas como é que eu nunca o tinha visto antes? Como é que eu não sabia que morava a menos de 5 quilômetros do único garoto do planeta que consegue me provocar ondas de calor e frustração?
Limpo a garganta.
— Bem, obrigada pela água. — Não tem nada que eu queira mais no mundo que fugir desse constrangimento. Aceno brevemente e começo a correr.
— Espere aí — grita ele atrás de mim. Não desacelero, então ele passa por mim e se vira, correndo para trás contra o sol. — Deixe eu encher sua garrafa. — Ele estende o braço e pega a garrafa de minha mão esquerda, encostando sua mão em minha barriga. Congelo mais uma vez. — Já volto — diz dele, correndo para dentro de casa.
Estou perplexa. Que ato de bondade mais contraditório. Será que é mais um efeito do transtorno de múltiplas personalidades? É provável que ele seja um mutante, como o Hulk. Ou como em O médico e o monstro. Será que Joseph é a personalidade boazinha e Jonas, a assustadora? Com certeza foi Jonas que vi no mercado mais cedo. Acho que gosto bem mais de Joseph.
Fico um pouco constrangida de esperar, então volto para perto da casa dele, parando às vezes para olhar o caminho que vai dar na minha. Não faço ideia do que fazer. Sinto que qualquer decisão que eu tomar a essa altura vai para o lado da balança que mede as burrices.
Será que devo ficar?
Será que devo correr?
Será que devo me esconder nos arbustos antes que ele volte com algemas e uma faca?
Antes que eu tenha a oportunidade de sair correndo, a porta da casa se escancara, e ele aparece com a garrafa cheia. Dessa vez o sol está atrás de mim, por isso não tenho tanta dificuldade em enxergá-lo. O que também não é uma coisa boa, pois tudo o que quero fazer é ficar encarando o garoto.
Argh! Odeio muito a luxúria.
O-dei-o.
Cada célula sabe que ele não é uma boa pessoa, mas meu corpo parece não dar a mínima para isso.
Ele me entrega a garrafa, e, na mesma hora, tomo mais um gole. Já odeio o calor do Texas naturalmente, mas, combinado a Joseph Jonas, parece que estou nas profundezas do Inferno.
— Então... mais cedo... no mercado... — diz ele, fazendo uma pausa nervosa. — Se a deixei constrangida, peço desculpas.
Meus pulmões estão implorando por ar, mas, de alguma maneira, consigo dar um jeito de responder:
— Você não me deixou constrangida.
Você meio que me deixou apavorada.
Jonas estreita os olhos para mim por alguns segundos, me observando. Hoje descobri que não gosto de ser observada... prefiro não ser percebida.
— Também não estava tentando dar em cima de você — afirma ele. — Só achei que fosse outra pessoa.
— Está tudo bem. — Forço um sorriso, mas não está tudo bem. Por que de repente estou sendo consumida pelo desapontamento de ele não ter tentado dar em cima de mim? Devia estar contente.
— O que não quer dizer que eu não daria em cima de você — acrescenta ele sorrindo. — Só não estava fazendo isso naquele momento.
Ah, obrigada, meu Deus. O esclarecimento me faz sorrir, apesar de todos os meus esforços em contrário.
— Quer que eu corra com você? — pergunta ele, apontando com a cabeça em direção à calçada atrás de mim.
Sim, por favor.
— Não, está tudo bem.
Ele balança a cabeça.
— Bem, eu estava indo naquela direção de qualquer jeito. Corro duas vezes ao dia e ainda tenho alguns... — Ele para de falar no meio da frase e dá um passo para perto de mim rapidamente. Em seguida, segura meu queixo e inclina minha cabeça para trás. — Quem fez isso com você? — A mesma frieza que vi em seus olhos no mercado reaparece.
— Seu olho não estava assim mais cedo.
Afasto meu queixo e rio.
— Foi um acidente. Jamais interrompa o cochilo de uma garota.
Ele não sorri. Em vez disso, se aproxima mais, me observa atentamente e passa o dedão embaixo do meu olho.
— Você contaria para alguém, não é? Se fizessem isso com você?
Quero responder. Quero mesmo. Mas não consigo. Ele está tocando meu rosto. Sua mão está na minha bochecha. Não consigo pensar, não consigo falar, não consigo respirar. A intensidade proveniente de toda sua existência suga o ar dos meus pulmões e a força dos meus joelhos. Balanço a cabeça de maneira não muito convincente. Ele franze a testa e afasta a mão.
— Vou correr com você — afirma ele, pondo as mãos nos meus ombros e me virando na direção oposta para me dar um leve empurrão. Ele entra no mesmo ritmo que eu, e passamos a correr em silêncio.
Quero conversar com ele. Quero perguntar sobre o ano que passou na prisão, por que desistiu do colégio, o porquê daquela tatuagem... mas tenho medo das respostas. Sem falar que estou completamente sem fôlego. Em vez disso, corremos em total silêncio até chegarmos a minha casa.
Ao nos aproximarmos da entrada, começamos a andar. Não faço ideia de como terminar isso. Ninguém jamais corre comigo, então não sei o que manda a etiqueta quando dois corredores se despedem. Eu me viro e dou um breve aceno para ele.
— Então até qualquer hora?
— Com certeza — diz ele, me encarando.
Sorrio constrangida e me viro. Com certeza? Fico pensando nisso enquanto cruzo a entrada. O que ele quis dizer com isso? Nem tentou pegar o número do meu telefone, apesar de não saber que não tenho um. Não perguntou se eu queria correr com ele de novo. Mas disse com certeza como se tivesse absoluta certeza, e eu meio que espero que isso seja mesmo verdade.
— Demi, espere. — A maneira como sua voz pronuncia meu nome me faz desejar que a única palavra de todo seu vocabulário fosse Demi. Eu me viro, rezando para que ele não mande mais uma daquelas cantadas bregas. Porque agora eu totalmente cairia.
— Pode me fazer um favor?
Qualquer coisa. Faço qualquer coisa que me pedir enquanto estiver sem camisa.
— Sim?
Ele joga sua garrafa de água para mim. Eu a pego e olho para a garrafa vazia, sentindo-me culpada por não ter me oferecido para enchê-la. Balanço-a no ar e faço que sim com a cabeça, em seguida subo os degraus correndo e entro em casa. Dianna está enchendo o lava-louça quando irrompo na cozinha. Assim que a porta da frente se fecha atrás de mim, arfo para poder dar aos meus pulmões o ar pelo qual estavam implorando.
— Meu Deus, Demi. Parece até que vai desmaiar. Sente-se. — Ela pega a garrafa das minhas mãos e me obriga a sentar. Deixo que ela a encha enquanto inspiro pelo nariz e expiro pela boca. Ela se vira, entrega-a para mim, e fecho a tampa. Em seguida, me levanto e corro lá para fora até Jonas.
— Obrigado — diz ele. Fico parada, observando-o pressionar aqueles mesmos lábios carnudos na boca da garrafa.
Estamos praticamente nos beijando de novo.
Não consigo distinguir o efeito da minha corrida de quase 8 quilômetros do efeito que Jonas provoca em mim. As duas coisas fazem com que me sinta prestes a desmaiar por falta de oxigênio. Ele fecha a tampa da garrafa, e seus olhos percorrem meu corpo, parando por tempo demais em minha barriga à mostra antes de me olhar nos olhos.
— Você faz atletismo?
Cubro a barriga com o braço esquerdo e ponho as mãos na cintura.
— Não. Mas estou pensando em tentar entrar para a equipe.
— Devia mesmo. Mal consegue respirar e mesmo assim acabou de correr quase oito quilômetros — diz ele. — Você está no último ano?
Ele não faz ideia do esforço que estou precisando fazer para não desabar na calçada e ficar chiando por falta de ar. Jamais corri tanto de uma só vez e estou usando todas as minhas forças para aparentar que isso não foi nada de mais. Pelo jeito está dando certo.
— Já devia saber que estou no último ano, não? Suas habilidades de perseguidor estão deixando a desejar.
Quando as covinhas dele reaparecem, fico com vontade de cumprimentar a mim mesma.
— Bem, é meio difícil perseguir você — diz ele. — Não a encontrei nem no Facebook.
Ele acabou de admitir que me procurou no Facebook. Eu o conheci há menos de duas horas, então o fato de ele ter ido direto para casa e me procurado no Facebook me deixa um pouco lisonjeada. Um sorriso involuntário surge no meu rosto, e fico com vontade de esmurrar esse ridículo arremedo de garota que tomou conta do meu ser normalmente indiferente.
— Não estou no Facebook. Não uso internet — explico.
Jonas lança um olhar para mim e abre um sorriso sarcástico, como se não estivesse acreditando em nada disso. Ele afasta o cabelo da testa.
— E seu celular? Não dá para usar internet no celular?
— Não tenho celular. Minha mãe não é fã dessas novas tecnologias. Também não tenho televisão.
— Caraca. — Ele ri. — Está falando sério? O que faz para se divertir?
Sorrio para ele e dou de ombros.
— Eu corro.
Jonas me observa mais uma vez, focando a atenção por um breve instante na minha barriga. Vou repensar essa história de sair de top de ginástica.
— Bem, então por acaso você não saberia o horário em que uma certa pessoa se levanta para correr de manhã, saberia? — Ele me olha, e não consigo ver de jeito nenhum a pessoa que Miley descreveu para mim. A única coisa que vejo é um garoto flertando com uma menina, o olhar um pouco nervoso e cativante.
— Não sei se você ia gostar de acordar tão cedo — digo. A maneira como ele está me olhando e o calor do Texas fazem minha vista se embaçar de repente, então respiro fundo, com o intuito de aparentar qualquer coisa diferente de exaustão e agitação.
Ele inclina a cabeça para perto da minha e estreita os olhos.
— Você não tem ideia do quanto eu quero acordar tão cedo assim. — Ele abre aquele sorriso com as covinhas, e eu desmaio.
Sim... literalmente. Desmaiei.
E, pela dor no meu ombro e o cascalho e terra grudados na minha bochecha, não foi uma queda bonita e graciosa. Apaguei e bati no chão antes mesmo que ele tivesse qualquer chance de me segurar. Tão diferente dos heróis nos livros.
Estou deitada no sofá, presumivelmente onde ele me deixou após ter me carregado para dentro de casa. Dianna está parada ao meu lado com um copo
d’água, e Jonas, atrás dela, observando o desenrolar do momento mais vergonhoso de minha vida.
— Demi, tome um pouco d’água — diz Dianna, erguendo minha nuca e me pressionando em direção ao copo. Bebo um gole, encosto no travesseiro e fecho os olhos, querendo mais que tudo desmaiar outra vez. — Vou pegar um pano úmido.
Abro os olhos, esperando que Jonas tenha decidido ir embora despercebido depois que Dianna saiu do cômodo, mas ele continua aqui. E agora está mais perto de mim. Ele se ajoelha no chão ao meu lado e estende a mão para meu cabelo, tirando o que imagino ser cascalho ou alguma sujeira.
— Tem certeza de que está bem? Você caiu bem feio. — Seus olhos estão cheios de preocupação, e ele limpa algo da minha bochecha com o polegar, depois apoia a mão ao meu lado no sofá.
— Ah, meu Deus — digo, cobrindo os olhos com o braço. — Mil desculpas. Estou morrendo de vergonha.
Jonas segura meu punho e afasta meu braço do rosto.
— Shh. — A preocupação nos olhos dele diminui, e um sorriso brincalhão toma conta de suas feições. — Meio que estou curtindo isso.
Dianna volta para a sala
— Aqui está o pano, querida. Quer algo para a dor? Está enjoada? — Em vez de entregá-lo para mim, ela o deixa com Jonas e volta para a cozinha. — Devo ter um pouco de extrato de calêndula ou de bardana.
Ótimo. Como se eu já não estivesse morrendo de vergonha, ela está prestes a piorar ainda mais a situação me obrigando a tomar uma de suas misturas caseiras bem na frente dele.
— Estou bem, mãe. Não estou com dor alguma.
Delicadamente, Jonas põe o pano na minha bochecha, limpando-a.
— Talvez não esteja sentindo dor agora, mas depois vai sentir, sim — diz ele, baixinho demais para que Dianna escutasse. Ele para de examinar minha bochecha e olha nos meus olhos. — Você devia tomar alguma coisa, só para garantir.
Não sei por que a sugestão parece mais simpática quando sai de sua boca e não da de Dianna, mas concordo com a cabeça. E engulo em seco. E prendo a respiração. E aperto as coxas uma contra a outra. Também tento me sentar, porque ficar deitada no sofá com ele tão perto de mim está quase me fazendo desmaiar de novo.
Quando ele vê o esforço para me sentar, segura meu cotovelo e me ajuda. Dianna volta para a sala e me entrega um pequeno copo de suco de laranja. Suas misturas são amargas demais, por isso tenho de tomar com suco para não acabar cuspindo tudo. Pego o copo da mão dela, bebendo tudo o mais rapidamente que já tomei algo na vida, e imediatamente o devolvo. Só quero que ela volte para a cozinha.
— Desculpe — diz ela, estendendo a mão para Jonas. — Meu nome é Dianna Lovato.
Jonas se levanta e aperta a mão dela.
— Joseph Jonas. Meus amigos me chamam de Jonas.
Fico com inveja por ela estar tocando na mão dele. Quero pegar uma senha e entrar na fila.
— De onde você e Demi se conhecem? — pergunta ela.
Jonas olha para mim na mesma hora em que ergo o olhar para ele. Seu lábio mal se curva, formando um sorriso, mas eu percebo.
— Na verdade, não nos conhecemos — diz ele, olhando para ela. — Acho que eu estava no lugar certo na hora certa, só isso.
— Bem, agradeço por tê-la ajudado. Não sei por que ela desmaiou. Ela nunca havia desmaiado. — Dianna olha para mim. — Você comeu alguma coisa hoje?
— Um pedaço de frango no almoço — respondo, sem mencionar o Snickers que comi antes da corrida. — A comida do refeitório é um lixo.
Ela revira os olhos e ergue as mãos para o ar.
— Por que foi correr sem antes comer?
Dou de ombros.
— Esqueci. Não costumo correr à tarde.
Ela volta para a cozinha com o copo e suspira fundo.
— Não quero que corra mais, Demi. O que poderia ter acontecido se estivesse sozinha? Além disso, você corre demais.
Ela só pode estar brincando. Não posso parar de correr de jeito nenhum.
— Olhe — diz Jonas, observando o resto de cor se esvair do meu rosto. Ele olha para Dianna na cozinha. — Moro aqui perto, na Ricker, e passo correndo por aqui todas as tardes. — (Ele está mentindo. Eu teria percebido). — Se isso a deixar mais tranquila, seria ótimo correr com ela na próxima semana ou durante as manhãs. Costumo correr nas pistas do colégio, mas não tem problema. Só para garantir que isso não vai acontecer de novo.
Ah. Uma luzinha se acende em minha cabeça.
Claro que esse abdômen me pareceu familiar.
Dianna volta para a sala e olha para mim, depois para ele. Ela sabe o quanto gosto de minhas corridas solitárias, mas dá para ver em seus olhos que ficaria mais tranquila se eu tivesse um parceiro de corrida.
— Por mim tudo bem — assegura ela, olhando para mim. — Se Demi gostar da ideia.
Sim, sim, gosto. Mas só se meu novo parceiro de corrida estiver sem camisa.
— Gosto — confirmo. Eu me levanto e, ao fazer isso, fico tonta mais uma vez. Acho que também fico pálida, pois Jonas põe a mão no meu ombro em menos de um segundo, me fazendo voltar para o sofá.
— Calma — pede ele, e olha para Dianna. — Você tem algum biscoito? Talvez ajude.
Dianna vai até a cozinha, e Jonas olha de novo para mim, os olhos cheios de preocupação.
— Tem certeza de que está bem? — Ele alisa minha bochecha com o dedo.
Estremeço.
Um sorriso diabólico surge em seu rosto ao perceber minha tentativa de cobrir os braços arrepiados. Ele olha para Dianna na cozinha e depois volta a me encarar.
— Que horas você quer que eu venha persegui-la amanhã? — sussurra ele.
— 6h30? — digo baixinho, olhando para ele, impotente.
— 6h30 está ótimo.
— Jonas, você não precisa fazer isso.
Os olhos azuis hipnotizantes ficam observando meu rosto por vários segundos, em silêncio, e não consigo deixar de encarar a boca igualmente hipnotizante enquanto ele fala.
— Sei que não preciso fazer isso, Demi. Faço o que quero fazer. — Ele se aproxima do meu ouvido e baixa a voz, passando a sussurrar. — E eu quero correr com você. — Ele se afasta e fica me observando. Devido a todo o caos em minha cabeça e estômago, não consigo responder.
Dianna volta com os biscoitos.
— Coma — diz ela, colocando-os na minha mão.
Jonas levanta-se, despede-se de Dianna e depois se volta para mim.
— Se cuida. Vejo você de manhã?
Faço que sim com a cabeça e o observo enquanto ele se vira para ir embora. Não consigo tirar os olhos da porta depois que ele a fecha. Estou perdendo a cabeça. Perdi totalmente qualquer resquício de autocontrole. Então é isso que Miley ama? Isso é luxúria?
Odeio a luxúria. Sem dúvida alguma. Odeio totalmente essa sensação linda e mágica.
— Ele é tão legal — diz Dianna. — E bonito. — Ela se vira para mim. — Você não o conhece?
Dou de ombros.
— Já ouvi falar dele — digo. E é tudo o que revelo.
Se ela soubesse o quanto meu “parceiro de corrida” é um caso perdido, acabaria surtando. Quanto menos ela souber sobre Joseph Jonas, melhor para nós duas.

Segunda-feira, 27 de agosto de 2012
19h10

— O que diabos aconteceu com seu rosto? — Eddie solta meu queixo e passa por mim indo em direção à geladeira.
Eddie está presente na vida de Dianna há cerca de um ano e meio. Janta conosco algumas vezes por semana e, como hoje é o jantar de despedida de Miley, ele nos deu a honra de sua presença. Por mais que goste de pegar no pé de Miley, sei que também vai sentir sua falta.
— Briguei na rua hoje — respondo.
Ele ri.
— Então foi isso o que aconteceu com a rua.
Miley escolhe uma fatia de pão e abre o pote de Nutella. Pego o prato e me sirvo com a mais recente invenção vegana de Dianna. Sua culinária é uma coisa à qual é preciso se acostumar, algo que Miley ainda não conseguiu depois de quatro anos. Eddie, por outro lado, é o gêmeo encarnado de Dianna, então não se incomoda com a comida. O menu de hoje é algo cujo nome nem consigo pronunciar, mas não tem nenhuma derivação animal, como sempre. Dianna não me obriga a consumir apenas comidas vegana, então experimento o que quero quando não estou em casa.
Tudo o que Miley come serve apenas como complemento ao seu prato principal — a Nutella. Hoje ela escolheu um sanduíche de queijo com Nutella. Não sei se eu seria capaz de me acostumar a isso.
— Então, quando vai se mudar para cá? — pergunto a Eddie.
Ele e Dianna têm discutido o próximo passo na relação, mas jamais conseguem concordar quanto à rigorosa regra antitecnologia dela. Bem, Eddie não consegue aceitar isso. Já Dianna está muito bem resolvida com esse assunto.
— Quando sua mãe ceder e assinar a ESPN — diz Eddie.
Eles não discutem sobre isso. Acho que os dois estão satisfeitos com a situação atual, então nenhum deles está com muita pressa de sacrificar as opiniões divergentes em relação à tecnologia moderna.
— Demi desmaiou na rua hoje — diz Dianna, mudando de assunto. — Um garotinho encantador carregou ela para dentro de casa.
Eu acho graça.
— Um cara, mãe. Por favor, não diga garotinho.
Do outro lado da mesa Miley me fulmina com o olhar e percebo que não lhe contei da minha corrida essa tarde. Nem sobre meu primeiro dia de aula. Hoje foi um dia movimentado. Para quem será que vou confidenciar o que acontece comigo depois que ela for embora? Fico apavorada só de pensar que Miley vai estar do outro lado do mundo daqui a dois dias. Espero que Nick consiga ocupar o lugar dela. Bem, ele provavelmente adoraria isso.
— Você está bem? — pergunta Eddie. — Deve ter caído bem feio para ficar com esse olho aí.
Estendo a mão até o rosto e faço uma careta. Tinha me esquecido completamente do olho roxo.
— Isso não foi por causa do desmaio. Miley me deu uma cotovelada. Duas vezes.
Fico esperando que pelo menos um dos dois pergunte a Miley por que ela me atacou, mas nenhum deles faz isso. O que mostra o quanto eles amam minha amiga. Nem se importam se ela bate em mim; provavelmente diriam que mereci.
— Você não fica irritada por seu nome ser um número? — pergunta Eddie para ela. — Nunca entendi isso. É como quando os pais colocam no filho o nome de um dos dias da semana. — Ele faz uma pausa com o garfo no ar e olha para Dianna. — Quando tivermos um filho, não vamos fazer isso com ele. Qualquer palavra que puder ser encontrada num calendário está proibida.
Dianna o encara com uma expressão gélida. Se eu tivesse de adivinhar por sua reação, diria que é a primeira vez que Eddie falou em ter filhos. Se eu tivesse de adivinhar pelo olhar em seu rosto, diria que ter filhos não é algo que ela esteja planejando para o futuro. Nem para nunca.
Eddie volta sua atenção para Miley.
— Seu verdadeiro nome não é Destiny ou Thirteen ou algo assim? Não entendo por que escolheu Miley. Acho que é o pior número que podia ter escolhido.
— Vou aceitar seus insultos — diz Miley. — É só a maneira de disfarçar o quanto está arrasado com minha partida.
Eddie ri.
— Pode aceitar. Terei mais deles quando você voltar daqui a seis meses.
Depois que Eddie e Miley vão embora, ajudo Dianna na cozinha com os pratos. Desde que Eddie falou sobre ter filhos, ela ficou quieta demais.
— Por que isso a enlouqueceu tanto? — pergunto a ela, entregando um prato para ela lavar.
— O quê?
— Quando ele fez aquele comentário sobre os filhos de vocês. Você tem trinta e poucos anos. As pessoas têm filhos o tempo todo nessa idade.
— Foi tão óbvio assim?
— Para mim, foi.
Ela pega outro prato para lavar e depois suspira.
— Amo Eddie. Mas também amo eu e você. Gosto de como as coisas são entre nós duas e não sei se estou pronta para mudar isso, muito menos para inserir outro filho nessa história. Mas Eddie quer tanto essas coisas.
Fecho a torneira e enxugo as mãos na toalha.
— Vou fazer 18 anos em algumas semanas, mãe. Por mais que você queira que as coisas entre nós continuem as mesmas... isso não vai acontecer. Vou me mudar para a faculdade depois do próximo semestre, e você vai ficar morando aqui sozinha. Talvez não seja tão ruim considerar a ideia de pelo menos deixar ele se mudar para cá.
Ela sorri para mim, mas é um sorriso aflito, o mesmo que aparece toda vez que toco no assunto da faculdade.
— Tenho considerado essa ideia, Demi. Pode acreditar. Só que esse é um passo importante que não pode ser desfeito depois que a decisão já foi tomada.
— Mas e se for um passo que você não queira que seja desfeito? E se for um passo que só vai fazer você ter mais vontade de dar outro passo, e depois mais outro, até acabar correndo em disparada?
Ela ri.
— É exatamente disso que tenho medo.
Enxugo o balcão e lavo o pano na pia.
— Às vezes não entendo você.
— E eu também não a entendo — diz ela, cutucando meu ombro. — Sou incapaz de entender por que quis tanto estudar num colégio. Sei que disse que foi até divertido, mas me conte o que realmente achou.
Dou de ombros.
— Foi legal — minto. Minha teimosia sempre fala mais alto. Jamais vou revelar a ela o quanto odiei ir à escola hoje, mesmo sabendo que ela nunca diria “eu avisei”.
Ela seca as mãos e sorri para mim.
— Que bom. Quem sabe quando eu perguntar de novo amanhã, você me conte a verdade.
Tiro da mochila o livro que Nick me deu e o deixo em cima da cama. Leio apenas duas páginas antes de Miley entrar pela janela.
— Colégio primeiro, presente depois — diz ela, se acomodando ao meu lado na cama enquanto coloco o livro na mesinha de cabeceira.
— O colégio foi um saco. Graças a você e sua inabilidade de simplesmente dizer não aos garotos, herdei sua péssima reputação. Mas por intervenção divina, fui resgatada por Nick, o adotado mórmon gay que não sabe cantar nem atuar, mas ama ler e é meu melhor amigo no mundo inteiro.
Miley faz beicinho.
— Nem fui embora ainda e você já me substituiu? Que cruel. E, só para constar, não sou incapaz de dizer não aos garotos. Apenas não entendo as consequências morais do sexo antes do casamento. De muito e muito sexo antes do casamento.
Ela põe uma caixa no meu colo. Uma caixa desembrulhada.
— Sei o que está pensando — diz ela. — Mas fique sabendo que a falta de embrulho não demonstra o que sinto por você. Foi só preguiça.
Pego a caixa e a balanço.
— É você que está indo embora, sabia? Eu que devia estar dando um presente para você.
— É, devia mesmo. Mas você é péssima em dar presentes e não acho que vá mudar só por minha causa.
Ela tem razão. Sou péssima em dar presentes, mas isso acontece principalmente porque odeio muito receber presentes. É quase tão constrangedor quanto pessoas chorando. Viro a caixa e encontro a aba. Levanto-a e, então, abro. Removo o papel crepom, e um celular cai na minha mão.
— Miley — digo. — Sabe que não posso...
— Cale a boca. Jamais iria para o outro lado do mundo sem ter como me comunicar com você. Você não tem nem e-mail.
— Eu sei, mas não posso... não tenho emprego.
Não tenho como pagar por isso. E Dianna...
— Relaxe. É um celular pré-pago. Coloquei créditos que cobrem minutos suficientes para que a gente possa trocar uma mensagem por dia enquanto eu estiver longe. Não tenho dinheiro para fazer ligações internacionais, então quanto a isso você não deu sorte. E, só para não desobedecer os valores parentais cruéis e distorcidos de sua mãe, não tem nem internet nessa porcaria. Só dá para enviar mensagem de texto.
Ela pega o celular e liga o aparelho e, em seguida, coloca suas informações nos contatos.
— Se acabar arranjando um namorado gato enquanto eu estiver longe, pode muito bem acrescentar minutos a mais. Mas, se ele usar meus minutos, corto o saco dele fora.
Ela me devolve o celular, e pressiono o botão home. Seu nome nos contatos aparece como Sua melhor, MELHOR amiga no mundo inteiro.
Sou péssima em receber presentes e sou muito pior com despedidas. Guardo o telefone de volta na caixa e me curvo para pegar minha mochila. Tiro os livros, coloco-os no chão, me viro e balanço a mochila em cima de Demi, observando todas as notas caírem em seu colo.
— Aqui tem 37 dólares — digo. — Para você sobreviver até voltar. Feliz dia do intercâmbio.
Ela enche a mão com as notas e as joga no ar, e, em seguida, se joga na cama.
— Primeiro dia no colégio e as vacas já encheram seu armário? — Ela ri. — Impressionante.
Coloco em seu peito o cartão de despedida que escrevi, e apoio a cabeça em seu ombro.
— Achou isso impressionante? Devia ter visto meu pole dance no refeitório.
Ela pega o cartão e passa os dedos por ele, sorrindo. Não o abre, porque sabe que não gosto quando as coisas ficam constrangedoramente emotivas. Ela encosta o cartão no peito mais uma vez e apoia a cabeça no meu ombro.
— Você é a maior vagabunda — diz ela baixinho, tentando conter as lágrimas, pois somos teimosas demais para chorar.
— Pois é, foi o que me disseram.

*****

Desculpem a demora pra postar, mas tinha muita visualização pra pouco comentário, então sim, demorei de propósito.
To feliz que estejam gostando, amanhã respondo os comentários.
Já to toda chorosa pelo Lovatic Day  
Enfim, amanhã, se tiver comentários, eu posto, ok?
Bjs, amo vcs

5 comentários:

  1. To amando posta logo por favor de preferência todo diaaaaa

    ResponderExcluir
  2. Mds.
    Eu tive que ler os outros capítulos da outra fic e agr essa.
    ~~ I'm Back ~~
    Guria posta logo pf

    ResponderExcluir
  3. to adorando essa fanfic posta logo por favo

    ResponderExcluir
  4. Eu sei bem como é esse negocio de comentários, quando poucas comentam na minha eu fico chateada, não que eu queira fama nem nada, é que os comentários me incentivam a continuar e tal, quando poucas comentam é como se o resto não se importasse uehuheueh enfim...
    Amei o capítulo, amei essa proximidade toda do Joseph com a Demi.
    Agora ele não parece mesmo ser o cara que Miley descreveu, mas, como os ditados dizem, as aparecias enganam, então, tudo pode acontecer jsdksdsl
    Miley não devia ir embora, sacanagem, viu :(
    Já quero um beijo jemi, sou meio apressada, sabe?
    Continua logo, beijos.

    ResponderExcluir
  5. Adorando..... esse Joe esta muito misterioso...... achei estranho esses desmaios da Demi..... continua.....

    ResponderExcluir